Tio FlávioPalestrante, professor e criador do movimento voluntário Tio Flávio Cultural.

Viajar ou não viajar?

28/10/2021 às 19:07.
Atualizado em 05/12/2021 às 06:09

Um casal amigo me mandou uma mensagem dizendo que tinha uma viagem com um preço imperdível para os “Lençóis Maranhenses” e que eles já tinham acertado com a agente da companhia de turismo as passagens e hospedagem. Falaram que era para eu avaliar e responder rápido, pois o grupo já estava quase formado e a empresa não seguraria o preço por muito tempo.

Na hora pensei que não fosse uma viagem para mim, pois não gosto desses programas com grupos de desconhecidos, mas como esse casal amigo estaria, reconsiderei e comprei o tal “pacote”.

Não fiz planos, não pesquisei sobre o destino, na correria eu só bloqueei a agenda e pronto. Mais próximo da data eu veria como é o lugar e o que tinha pra fazer, independente do grupo.

Eis que uma semana antes o casal amigo tem um problema de saúde e resolve cancelar sua ida, justamente no último dia em que essa possibilidade ainda existia. Só no fim do dia conseguiram me avisar. Pensei em desistir, mesmo perdendo a minha quantia em dinheiro, afinal, viajar com um monte de desconhecido era desconfortável para mim.

Mas já tinha cancelado palestras nesse período da viagem e iria perder dinheiro por cisma, então resolvi embarcar. Dois dias antes consultei sobre o destino e via as palavras “areia” e “rio” sobressaindo, com uma explicação de que todos os destinos de passeios partiam de uma cidade pequena do Maranhão, que tinha uma parada em que os turistas alimentavam uns primatas e por aí vai. Pensei já em pernilongo, calor exagerado, falta de paciência, mas não dava para desistir.

Tem uma frase atribuída ao Amyr Klink que diz o seguinte: “pior do que não terminar uma viagem é nunca partir!”, que complementa muito bem o que Lao Tzu afirmou: “uma jornada de mil quilômetros começa com apenas um passo.” Tá bom, me convenci. Fui.

O grupo era formado, em sua maioria, por mulheres, sendo boa parte delas acima de 60 anos, muitas companheiras de outras viagens. No primeiro trajeto eu ainda estava tímido, recolhido. Chegamos ao hotel tarde e fui dormir. No dia seguinte, que seria livre, numa cidade bem pequena, que é Barreirinhas-MA, nos encontrávamos no café da manhã, na rua, na piscina – na cidade tem rio, mas não tem mar. Para chegar ao mar, precisa fazer uma travessia pelo rio.

No segundo dia eu já estava encantado com a cidadezinha. Adorara parar numa cafeteria para comer tapioca e tomar um café. No último dia fui lá fazer meu lanche e o dono já sabia o sabor da tapioca que eu mais gostei e ainda deixou a caneca de café por conta da casa.

Adorava sentar-me para ouvir as histórias do grupo, ficava até tarde no saguão do hotel conversando com as minhas companheiras de viagem, dava o braço para umas para ajudar a subir as dunas e aceitava ajuda dos guias para subir outras.

Nos divertimos com os macaquinhos na comunidade de Vassouras, que na primeira distração que temos, conseguem até abrir nossas mochilas. Eu, que nunca fui assaltado em BH, tive um copinho de doce levado por um desses primatas, na esperteza dele e na minha distração. Eu estava distraído, olha que delícia.

No último dia de viagem, o grupo já sabia de boas histórias da vida uns dos outros, num compartilhamento de alegrias, perdas, ganhos, dores, alegrias de novo.

Brenna Smith diz que “viajar é a melhor forma de se perder e de se encontrar ao mesmo tempo”. Mas coube a Mário Quintana várias preciosidades, dentre as quais: “viajar é mudar a roupa da alma” e, já que está preparado para isso, lembre-se o que Quintana sabiamente disse: “eu não tenho paredes, só tenho horizontes”.

Os passeios que fizemos nessa viagem aos “Lençóis” foram lindos. Num dia, quando acabamos de subir uma imensa escadaria de madeira, vislumbramos aquelas dunas, num parque ecológico do tamanho do município de São Paulo, com 20% de vegetação e o restante de areia e água: milhares de lagoas naturais formadas pela água da chuva.

Meu comodismo, meus receios, minha antipatia me diziam para não ir. Fui “armado” e ao me entregar à viagem, curti bastante a paisagem, a cultura, a comida e as pessoas. E por falar nisso, as pessoas da cidade merecem um destaque à parte, pois são bem amáveis e prestativas.

Pablo Neruda disse que “se não escalar a montanha, você nunca poderá apreciar a vista”. Vou concordar com ele nisso também, pois foi bem isso que me aconteceu, metafórica e literalmente.

Mas, para encerrar, vai uma lição de um casal com quem mais tempo interagi: o marido me disse que para viajar é preciso três coisas: dinheiro, tempo e saúde. Dá para viajar com apenas dois, mas o mais importante deles é saúde, já que tempo e dinheiro é questão de ajuste. No grupo tinha pessoas que não estavam com a saúde em sua plenitude, mas que viveram dias plenos.

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