Aprovado pelo Senado, Ato Médico terá impacto no SUS

Johanna Nublat e Gabriela Guerreiro
19/06/2013 às 17:50.
Atualizado em 20/11/2021 às 19:16

BRASÍLIA - Se sancionado pela presidente Dilma Rousseff da forma como aprovado pelo Congresso, o projeto de lei apelidado de Ato Médico deverá ter impacto na rede pública de saúde. E ele pode ser negativo, teme o Conselho Federal de Enfermagem (Cofen). O texto foi aprovado no final da noite de ontem pelo Senado e prevê a regulamentação da profissão do médico, estabelecendo atos que são privativos da categoria e outros que podem ser realizados por outros profissionais.

Para o Cofen, atos praticados cotidianamente pela enfermagem na rede pública de saúde passarão a ser proibidos. Por exemplo, o diagnóstico de doenças como hanseníase, malária, DSTs, tuberculose e a prescrição de medicamentos para tratá-las - sempre seguindo protocolos de atendimento do Ministério da Saúde. "Pedir exames para gestante, por exemplo. A maior parte quem faz é o enfermeiro. Como vai ser isso? E o acompanhamento dos pacientes com hanseníase, tuberculose, Aids? O próprio Ministério da Saúde dá curso para os enfermeiros fazerem o diagnóstico onde não há médico", protesta Amaury Gonzaga, do Cofen.

Gonzaga acredita, ainda, que o Ato Médico impedirá que a acupuntura seja praticada por não médicos, ao definir que é ato privativo do médico a invasão da pele para punção, entre outros procedimentos. "O que o projeto quer dizer? Só quem pode mexer da pele para baixo é o médico. Faço acupuntura há 26 anos no SUS", diz o enfermeiro. Gonzaga diz que buscará a Justiça, de forma preventiva, para garantir a continuidade do seu trabalho, caso o texto seja sancionado por Dilma. Para o Cofen, haverá muita judicialização, que pode abarcar inclusive os direitos de enfermeiras realizarem o parto normal.

O Conselho Federal de Psicologia (CFP) também vê prejuízos para a categoria. Humberto Verona, presidente da entidade, entende que o Ato Médico impede que psicólogos identifiquem sintomas de doenças como depressão e transtornos. "Por exemplo, num quadro depressivo há uma série de alterações no funcionamento da pessoa. No diagnóstico psicológico, o psicólogo não vai poder falar dessas alterações, porque seria fazer um diagnóstico. Como um profissional não vai poder fazer o nexo com o transtorno?", diz.

Para respaldar a categoria, o CFP pretende editar uma resolução definindo os termos do diagnóstico psicológico - como feito hoje, antes da sanção do Ato Médico. Questionado sobre os impactos do projeto nos programas públicos de saúde, o ministro Alexandre Padilha (Saúde) afirmou que sua pasta ainda precisa analisar o texto final aprovado pelo Congresso - ainda não disponibilizado. "O governo vai analisar o texto final aprovado de forma que se valorize a profissão médica. Mas é muito importante manter o conceito de equipes multiprofissionais. Todos nós aprendemos, ao longo dos anos, a importância de uma equipe multiprofissional. Áreas como nutrição, psicologia, fisioterapia, terapia ocupacional, enfermeiros têm um papel muito grande no cuidado com o paciente", disse hoje o ministro.

Segundo a reportagem apurou, ainda não há clareza no governo sobre os impactos do projeto e a eventual necessidade de vetos pela presidente Dilma Rousseff.

Médicos

O próprio Conselho Federal de Medicina (CFM), que respalda o Ato Médico, entende que haverá mudanças da rede pública de saúde, com a necessidade da presença de médicos nas equipes, para que façam o primeiro diagnóstico e a prescrição dos medicamentos. "Hanseníase, tuberculose, hipertensão são todos programas que devem ser cuidados por uma equipe. Defendemos o que a lei agora prevê: que o diagnóstico e a prescrição sejam feitos inicialmente pelo médico. Mas o enfermeiro pode repetir os remédios prescritos e pedir exames", defendeu Roberto D'Ávila, presidente do CFM.

O conselho garante que o texto não abarca a realização de acupuntura ou tatuagem e diz que, em casos de emergência, outros profissionais devem oferecer os cuidados ao paciente - o que não retiraria do gestor uma eventual responsabilização, aponta a entidade. "Não vai haver uma caça às bruxas", diz D'Ávila. "Mas vamos exigir que toda equipe tenha um médico."

O conselho afirma que pretende reunir os demais conselhos profissionais para discutir o cenário da saúde.  

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