( Foto: ALESP (1º/09/2016) Foto: ALESP (1º/09/2016))
A propina destinada ao deputado Fernando Capez (PSDB), segundo denúncia do procurador-geral de Justiça de São Paulo, Gianpaolo Smanio, saiu do superfaturamento de suco de laranja comprado pela Secretaria de Educação do Estado junto à Cooperativa Orgânica Agrícola Familiar (COAF). O tucano é acusado por corrupção passiva e lavagem de dinheiro na máfia da merenda, esquema desbaratado pela Polícia Civil e pelo Ministério Público estadual na Operação Alba Branca, deflagrada em janeiro de 2016.
A acusação, que atinge outros oito investigados, inclusive o ex-chefe de gabinete da Secretaria de Educação do governo Alckmin, Fernando Padula, aponta que a propina supostamente paga a Capez, as comissões repassadas a lobistas da máfia da merenda e a um representante comercial da COAF "alcançaram ao menos o patamar de 10% do valor dos contratos administrativos - R$ 11.399.285,00 - celebrados" entre a Secretaria de Educação e a Cooperativa, entre 2014 e 2015.
"Os valores pagos a título de propina e comissões chegaram à cifra de R$ 1.139.928,50. Tais valores, evidentemente, foram extraídos daqueles gerados pelo superfaturamento do preço da mercadoria alienada a Secretaria da Educação, como salientado nos apontamentos constantes da auditoria do Tribunal de Contas do Estado de São Paulo, da qual adveio elevado prejuízo patrimonial ao erário público", aponta Gianpaolo Smanio.
O procurador afirma que a Secretaria de Educação fechou dois contratos com a cooperativa: um em novembro de 2014 no valor de R$ 2.859.919,92 por dois milhões de caixas de suco de laranja, contendo 200 ml cada, e outro para fornecer um 1,4 milhão de caixas de suco de laranja, contendo 1 litro cada, no montante de R$ 8.539.365,60.
O chefe do Ministério Público do Estado afirma que a materialidade dos crimes "está demonstrada" por diversos de documentos.
Segundo o procurador-geral, são "recibos, cópias de cheque, dos contratos simulados de prestação de serviço, do procedimento de chamada pública, relatórios de análise de dados telefônicos, relatórios de análise de dados bancários e fiscais".
A investigação identificou recibos firmados por um assessor de Capez em favor da Coaf no valor total de R$ 170 mil.
A Alba Branca foi deflagrada em janeiro de 2016 e desmontou um esquema de superfaturamento na venda de produtos agrícolas destinados à rede pública de ensino.
A acusação formal do Ministério Público de São Paulo atribui a Capez dois crimes de corrupção passiva, um direto e outro indireto. Um deles teria ocorrido no dia 29 de julho de 2014, por volta das 15 horas, na rua Tumiaru, n. 126, Jardim Paulista, em São Paulo.
"Em razão da função pública, mais especificamente do exercício do mandato eletivo de deputado estadual, Fernando Capez, diretamente, solicitou para si vantagem indevida de representantes da Cooperativa Orgânica Agrícola Familiar (COAF)", aponta a denúncia.
Neste dia, de acordo com o procurador-geral, Capez "esfregando os polegares aos indicadores das duas mãos, solicitou vantagem ilícita" e disse: "não esquece de mim, hein…, …estou sofrendo em campanha".
O outro episódio, segundo o chefe do Ministério Público, teria ocorrido indiretamente, entre 2 e 25 de agosto de 2014, nas dependências do gabinete do tucano, no Palácio 9 de Julho, sede da Assembleia Legislativa. Smanio afirma que Capez, "por intermédio do assessor parlamentar Jeter Rodrigues Pereira, com quem agia em concurso e com identidade de propósitos", solicitou vantagem indevida da Coaf.
Fernando Capez é procurador da Procuradoria de Justiça Criminal, de São Paulo. Está licenciado para o exercício do mandato deputado estadual. Esta denúncia contra o tucano aponta exclusivamente para sua suposta incursão junto à Pasta da Educação do Estado.
A ofensiva da máfia da merenda sobre administrações municipais é alvo de outra investigação, sob competência do Tribunal Regional Federal da 3.ª Região (TRF3) porque envolve prefeitos e verbas públicas da União.
Passo a passo
A Coaf venceu, em 2013, a chamada pública da Secretaria da Educação para fornecimento de suco de laranja, destinado a integrar a merenda escolar que seria distribuída aos alunos da rede de ensino estadual. A Cooperativa, no entanto, "não foi chamada pela Secretaria de Educação para celebrar o contrato administrativo" por "irregularidades que macularam o certame".
Gianpaolo Smanio anota que, "sem o preenchimento dos requisitos legais e regulamentares", a Coaf tentou fornecer o suco de laranja ao Estado por meio de "chamada pública, dispensando-se a prévia licitação".
"A obtenção desse ilegítimo intento dependia da interferência espúria de autoridades vinculadas à Secretaria de Educação ou de outras que pudessem influenciá-las a flexibilizar a fiscalização do cumprimento dos requisitos pertinentes", narra Smanio.
"Cientes do prestígio político de Leonel Júlio (ex-presidente da Assembleia Legislativa de São Paulo/MDB), os representantes da Cooperativa passaram a contatá-lo, visando sua intervenção junto a parlamentares que lhe eram próximos e que poderiam interferir em favor da Coaf, no sentido de que o mencionado processo seletivo fosse rapidamente concluído pela Secretaria de Educação, com a celebração do respectivo contrato administrativo."
A denúncia afirma que a partir de abril de 2014, Leonel Júlio e seu filho Marcelo Ferreira Júlio passaram a desempenhar o papel de lobistas. O motivo, segundo o Ministério Público Federal, era a "obtenção de ilícitas vantagens pessoais, que também seriam arcadas pelos representantes da Coaf".
"Entre os meses de maio e julho de 2014, para o alcance daquele desiderato dos representantes da Coaf, Leonel passa a manter contatos com o deputado Fernando Capez, parlamentar a quem prestava auxílio durante suas campanhas eleitorais e que, em razão do mandato parlamentar que detinha, exercia influência sobre agentes públicos lotados na Secretaria de Educação do Estado de São Paulo", relata o procurador-geral de Justiça.
De acordo com a acusação, em agosto daquele ano, Capez intensificou a pressão sobre agentes públicos da Secretaria de Educação. No dia 21, afirma o Ministério Público de São Paulo, "foi publicado novo edital, deflagrando a abertura de outra chamada pública".
O repasse da propina, segundo a denúncia, ocorreu por meio de empréstimo de um Gol branco para a campanha de Capez, no segundo semestre de 2014, e também pela "contraprestação em dinheiro".
A denúncia aponta que houve a celebração de dois simulados "contratos de prestação de serviços". O primeiro, no valor de R$ 250 mil - contemplando um cheque de R$ 50 mil como parte do pagamento - entre a Coaf e um assessor de Capez. O segundo acordo foi fechado entre a Cooperativa e uma empresa da qual Marcel Ferreira Júlio era preposto no valor de 4,5% do montante do contrato entre a Cooperativa e a Secretaria de Educação.
"A soma dos valores relacionados aos dois simulados contratos de prestação de serviços, constituía a maior parcela da vantagem indevida solicitada pelo deputado Fernando Capez, em contraprestação a sua espúria interveniência junto a Secretaria da Educação. A parcela restante correspondia ao empréstimo do veículo, utilizado pelo comitê do deputado Fernando Capez, durante a campanha eleitoral de 2014."
O Ministério Público de São Paulo sustenta que ficou acertado que "os valores, depois de sacados das contas da COAF, seriam entregues em espécie" a Marcel Julio, que repassaria a assessores de Capez. Os aliados do tucano, diz a denúncia, "se encarregariam de redirecioná-los para o pagamento das despesas de campanha do deputado".
Além destes dois contratos, Smanio anota que foi celebrado um terceiro acordo na qual a COAF era contratante e Marcel Julio o contratado. A Cooperativa "se comprometia a pagar o equivalente a 4% do valor do contrato administrativo que seria celebrado entre a cooperativa e a Secretaria de Educação".
Defesa
"O que não existe não pode ser provado", reagiu enfaticamente o deputado Fernando Capez à denúncia formal apresentada contra ele ao Tribunal de Justiça de São Paulo no âmbito da Operação Alba Branca.
Ao ser informado da denúncia do procurador-geral, Capez disse que, agora, ‘vai poder demonstrar o abuso dessa investigação perante a Justiça’.
"Irresponsabilidade é o mínimo que podemos dizer disso!", afirma o deputado.
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