(Cristiano Couto)
A menos de dois meses do início da campanha eleitoral, quais seriam os temas e propostas que os eleitores e entidades da sociedade civil gostariam de ver tratados pelos candidatos? Levantamento do Hoje em Dia mostra que as antigas bandeiras de investimento em educação, saúde e segurança pública permanecem no topo das reivindicações que a sociedade brasileira quer ver nos programas de governo dos pré-candidatos aos Palácios do Planalto e Tiradentes.
Representantes da sociedade civil, institutos de pesquisa e cientistas políticos apontam a contínua insatisfação do eleitor com a qualidade dos serviços públicos, além da preocupação de setores empresariais com a alta da inflação, a carga tributária excessiva e a falta de transparência na gestão pública.
De acordo com o cientista político Paulo Roberto Figueira Leal, doutor em ciência política pelo Iuperj e professor da UFJF, as demandas “antigas”, renovadas pelas manifestações populares de 2013, ainda não “caminharam para uma solução” nos governos municipal, estadual e federal.
“A porcentagem de cerca de 20% de votos brancos e nulos indica parcela expressiva da população que não se sente representada e é possível que esse número aumente este ano, ao decorrer do calendário eleitoral, porque não me parece que os governantes e pré-candidatos tenha resolvido a insatisfação popular das manifestações do ano passado”, disse. Para ele, é preciso também que os partidos explicitem suas posições ideológicas, voltadas para o liberalismo econômico ou às políticas sociais, para esclarecer o eleitor.
“As pessoas querem a universalização da saúde pública e educação de qualidade, mas sem a contrapartida da carga tributária. Deve-se entender que cada política pública é uma escolha. Nem sempre a sociedade entende que não há carga de impostos baixa que banque o atendimento universal na saúde e na educação. São contradições”, afirma Figueira.
O diretor de pesquisas do Instituto Sensus, Ricardo Guedes, lembra que uma das pesquisas divulgadas este ano apontou que, para os entrevistados, os fatores que levaram à explosão social das manifestações de julho de 2013 foram a percepção dos “gastos excessivos” e a “malversação em detrimento de investimentos do setor público”. Para o diretor-executivo da ONG Transparência Brasil, Cláudio Abramo, as reclamações foram dispersas, mas contribuíram para despertar as plataformas para o pleito deste ano.
Protestos
"Certamente os políticos vão se aproveitar da onda de protestos do ano passado e entre as plataformas dos candidatos que fariam mais sentido para os movimentos sociais que se mobilizaram em julho passado está a mãezona de todos os problemas de corrupção e ineficiência do Estado, que é a facilidade para nomear pessoas em cargos da administração pública”, diz.
Segundo o especialista, o fato de um presidente da República ou governador ter “liberdade completa” para distribuir cargos entre seus partidos da base torna a máquina pública voltada para os interesses partidários, e não, públicos. “Os governantes compram as legendas com essas nomeações e o Estado deixa de servir à população para servir ao interesse dos eleitos, aumentando as chances de corrupção e falta de eficiência na gestão. Técnicos passam a dar lugares a políticos”, afirma. Como uma das soluções, Abramo sugere que o Legislativo nas esferas federal e estadual limite o poder de nomeação de cargos por parte do Executivo.
Decisões devem envolver e ouvir população
Entre os representantes da sociedade civil em Minas Gerais, Anivaldo Matias de Souza, coordenador do comitê mineiro do Movimento de Combate à Corrupção Eleitoral (MCCE), lamenta a falta de espaço para o eleitor na construção do sistema político-eleitoral brasileiro. “O importante para a gente é a mudança do sistema político para que todos sejam representados. Os pré-candidatos deveriam promover um debate mais plural, considerando a população. O financiamento privado de campanha, se continuar assim, só vai representar empresários no Legislativo. É uma demanda urgente no Estado e no país”, destaca.
Para o presidente do Movimento das Associações de Moradores de BH, Fernando Santana, a participação da população deveria se dar na área de planejamento das cidades. “Não pode ser um faz de conta dos políticos. É preciso que haja uma integração com os moradores, soluções pensando no futuro, atender a sociedade e não a negócios”. Segundo o representante dos moradores, os programas de governo precisam contemplam ainda a segurança pública, o combate à corrupção e a mobilidade urbana.
“Em BH, por exemplo, têm aumentado o número de ocorrências e a impunidade Não pode haver a privatização da segurança, é uma questão pública. E a cidade está crescendo de forma desordenada. As classes sociais mais carentes precisam de um impulso para se integrar de forma maior”, acrescenta.
Na área ambiental, a superintendente executiva da Associação Mineira de Defesa do Meio Ambiente (AMDA), Maria Dalce Ricas, espera que as reivindicações de articulação entre as políticas sócio-econômicas com as ambientais e transparência nos processos de licenciamento, entre outras. “Em muito casos, as políticas ambientais se cruzam com os problemas sociais, porque as pessoas que não tem a mínima noção de meio ambiente degradam e poluem.
Outro ponto que poderia ser considerado é estabelecer parcerias entre empresas ou ONGs com o governo para gerir áreas de preservação ambiental com potencial turístico e gerar renda e proteção para os parques”, diz. “Em Minas, temos o Conselho Estadual de Meio Ambiente, mas, na União, o licenciamento é feito a portas fechadas, até mesmo a fiscalização”, conta. “Precisamos também de políticas econômicas que caracterizem a sustentabilidade. Hoje, uma empresa verde, ou seja, que reaproveita seus resíduos, enfrenta a mesma burocracia que uma empresa que não aproveita os resíduos”, completa.
Entre os segmentos econômicos, a preocupação passa pelo controle da inflação, redução da carga tributária e a criação de incentivos para manter e instalar novas empresas. Segundo o diretor-executivo da Confederação Nacional do Transporte (CNT), Bruno Batista, a última pesquisa encomendada pela entidade ao Instituto MDA apontou que 79% dos ouvidos percebem o aumento do custo de vida, com a alta da inflação, e das tarifas, especialmente dos alimentos. “Cabe aos pré-candidatos tratar da capacidade de um governo de promover o controle da inflação longe do topo da meta de 6,5%. A margem normal é de 4,5% e hoje está sendo trabalhada como se estivesse no patamar normal, mas não está”, comenta. Outro ponto destacado por ele é a má qualidade de atendimento na área da saúde. “Na última pesquisa CNT/MDA, 80% dos entrevistados disseram que a saúde está ruim no país. Acontece que o ganho econômico da classe C fez que eles pudessem ter acesso a outros tipos de serviço, outra parte dessa parcela da população começou a pagar imposto e deseja uma retribuição”.
O presidente do Sindicato da Indústria da Construção Civil no Estado de Minas Gerais (Sinduscon-MG), Luiz Fernando Pires, alerta que falta investimento em educação de qualidade. “Isso é fundamental para que aqui seja um bom lugar para atrair o empresariado e se fazer negócio”, ressalta.