(Editoria de Artes)
Pelo menos metade das 853 prefeituras mineiras prometem paralisar as atividades e as rodovias que cortam as cidades no próximo dia 24, em protesto contra a crise financeira enfrentada pelas administrações municipais.
A situação, provocada pelo descumprimento no repasse do Fundo de Participação dos Municípios (FPM), pelo cancelamento de convênios e pela baixa arrecadação, levou cerca de 70 prefeitos, representantes de 42 associações microrregionais, a entrarem num consenso quanto a manifestação durante reunião, nesta quinta-feira (30), na Assembleia Legislativa de Minas Gerais.
Desde o mês passado, conforme mostrou o Hoje em Dia, prefeituras de todas as regiões do Estado têm tomado medidas para diminuir custos básicos, desde economia com água, luz, telefone e combustível, até demissão de servidores e redução de expediente e salários. Agora, a situação ficou “insustentável”, de acordo com os prefeitos.
A ideia era parar por uma semana, mas os representantes acreditam que a mobilização deve ser feita em apenas um dia para não prejudicar a população.
“O governo federal cortou todos os nossos recursos. Estão ameaçando cancelar convênios, alguns estão com valores de convênios atrasados há mais de sete meses. E a diminuição do repasse do FPM não estava prevista”, afirma o prefeito de Pará de Minas e presidente da Associação Mineira de Municípios (AMM), Antônio Júlio. Ele se refere ao acordo de complementação firmado entre municípios e União. Mas, apenas metade do valor prometido foi repassado (veja infografia).
Impacto
Quanto menor a cidade, maior o impacto na queda dos repasses. Para municípios com até 10.188 habitantes, o FPM é a principal fonte de receita. Em Minas, 482 cidades dependem do repasse. Destas, 57% receberam apenas R$82 mil dos R$ 167 mil esperados.
Segundo Antônio Júlio, somente os setores de emergência na área da saúde funcionarão no dia 24. “A ideia é paralisar tudo. A parte administrativa, educação, coleta de lixo e postos de saúde, exceto atendimento de urgência. Tudo para fazer pressão e mostrar as dificuldades que estamos passando”, disse.
“Um prefeito ter que fazer esse tipo de coisa (paralisação) é um absurdo, mas é a crise que estamos vivendo. Vamos chamar de ‘agosto negro’”, diz o prefeito de Iguatama, na região Oeste do Estado, Leonardo Muniz (PSD).
Mais protestos
Outras duas manifestações estão marcadas para o mês que vem. Na próxima quarta-feira (5), prefeitos de todo o país se reunirão em frente ao Palácio do Planalto, em Brasília, convocados pela Confederação Nacional dos Municípios (CNM). Já no dia 13, haverá uma “marcha dos prefeitos” em Belo Horizonte e outras capitais.
Procuradoria vai ao STF contra o uso de depósitos judiciais
Muito criticada pelos prefeitos mineiros, a lei que autoriza o Estado a fazer uso de grande parte dos depósitos judiciais virou alvo de ação da Procuradoria-Geral da República (PGR). O órgão ingressou nesta quinta-feira (30) com um questionamento da norma junto ao Supremo Tribunal Federal (STF). A medida pode impedir que o Executivo estadual tenha acesso a cerca de R$ 6 bilhões depositados em juízo.
A Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) pede a suspensão cautelar da lei e, no mérito, a declaração de ilegalidade da norma sancionada pelo governador Fernando Pimentel. A Lei 21.720/2015 prevê que 70% dos depósitos judiciais sejam usados para custear a Previdência Social, pagar precatórios e assistência judiciária, e amortizar dívida com a União.
“A norma questionada é integralmente incompatível com a Constituição Federal de 1988, uma vez que viola diversos artigos e princípios constitucionais”, diz a ação. Entre eles, artigos que preveem a ofensa ao direito de propriedade e a instituição de empréstimo compulsório.
Ainda foi constatada a invasão de competência já que, segundo a lei, cabe à União disciplinar o funcionamento do sistema financeiro nacional mediante lei complementar. Em nota, a assessoria do governo informou que “o Estado defenderá em juízo a tese da constitucionalidade da medida”.
Recorde
A proposta foi aprovada em tempo recorde na Assembleia Legislativa a pedido do governador Fernando Pimentel. Tanto em primeiro quanto em segundo turnos, as votações causaram grande polêmica entre os parlamentares, mas a norma acabou passando com ampla vantagem.
De autoria de Pimentel em conjunto com o presidente do Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG), Pedro Bitencourt, a lei foi defendida pela base do governo como a saída para o ajuste de contas do Estado. O governo chegou a ameaçar contingenciar salários caso a proposta não fosse aprovada.
AMM pedirá ajuda financeira ao Estado, que vai abocanhar R$ 6 bi do fundo do TJMG
O presidente da Associação Mineira de Municípios (AMM), Antônio Júlio, afirmou que pedirá auxílio financeiro ao governo mineiro, apesar das dificuldades de caixa do Estado. Ele espera que com a lei sancionada no último dia 15, que autoriza o Executivo a utilizar cerca de R$ 6 bilhões referentes aos depósitos judiciais do fundo de reserva do Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG), o governador Fernando Pimentel possa ajudar as prefeituras.
“Sabemos que o governo também passa por dificuldades. Alega que não está cumprindo os deveres com os municípios por falta de repasse da União. Mas já que vai colocar a mão nos depósitos judiciais, então não dá mais para passar os problemas adiante”, disse Antônio Júlio.
Lei Federal
O dinheiro que será liberado para estados e municípios com a sanção do Projeto de Lei Complementar federal 37/2015, que permite o uso de 70% do dinheiro referente a processos judiciais apenas nos quais sejam parte, vai dar para pagar somente os precatórios dos municípios, avalia o prefeito de Uberaba, no Triângulo Mineiro, Paulo Piau (PMDB).
“Todos os municípios têm depósitos judiciais paralisados, e se isso servir pelo menos para pagar algum precatório já vai diminuir as dívidas. Então já é uma ajuda”.
Piau assume a Frente Mineira de Prefeitos (FMP) na próxima semana. Segundo ele, o prefeito de Belo Horizonte, Marcio Lacerda, presidente da Frente Nacional de Prefeitos (FNP), sinalizou apoio aos atos. “As cidades grandes também devem estar envolvidas nos protestos. Fiquei de informar ao prefeito (Marcio Lacerda) o que foi discutido para que haja uma ação que envolva os 853 municípios”, disse Piau.
Judicialização
No encontro realizado na Assembleia Legislativa, os prefeitos também se queixaram da chamada judicialização da saúde e pediram uma reforma para redistribuir a arrecadação com o ICMS.
“Esta semana, tive que retirar R$ 3,8 mil do meu bolso para pagar um tratamento de alta complexidade, após decisão da Justiça, pois não havia dinheiro no caixa da prefeitura”, contou o prefeito de Itajubá, no Sul de Minas, Rodrigo Riêra (PMDB).