Lei anticorrupção recebida com ressalvas em Minas

Patrícia Scofield - Hoje em Dia
30/01/2014 às 08:05.
Atualizado em 20/11/2021 às 15:40
 (Flávio Tavares/Hoje em Dia)

(Flávio Tavares/Hoje em Dia)

A lei anticorrupção, que entrou em vigor quarta-feira (29), inicialmente na administração federal, para coibir fraudes em licitações entre o poder público e empresas foi bem recebida pelo empresariado de Minas Gerais.

No entanto, teme-se que recaia para o empresário a fama de “corruptor”, ou ainda, que possa haver um aumento de problemas trabalhistas entre patrões e empregados.

Na avaliação do presidente da Federação das Indústrias do Estado de Minas Gerais, Olavo Machado, a nova regra poderá inibir casos de “caixa dois”. “É um instrumento que vai fazer com que governos e empresas pensem duas vezes, porque cada vez vai ter mais rigor. Espero que ela não precise ser usada e que pequenas empresas consigam concorrer, não só as nacionais. Mas não se pode colocar o empresário como o grande corruptor. Tem sempre dois lados: o corruptor e o corrupto. Muitas vezes são oportunidades do sistema, criadas pelo próprio governo”, afirma. Olavo Machado diz que casos recentes de fraudes envolveram empresas estrangeiras que atuam no Brasil. “Os últimos fatos que vieram ao conhecimento pela mídia são de empresas que não fazem lá fora o que ela fazem aqui no nosso país”.

Para o presidente do Sindicato da Indústria da Construção Pesada no Estado de Minas Gerais (Sicepot-MG), Alberto Salum, há a preocupação de que possíveis desentendimentos entre empresários e empregados levem ao cometimento de atos ilícitos intencionais. “Os empresários do setor já me procuraram para comentar essa questão de que a responsabilidade vai cair sobre eles. Não conheço a lei a fundo ainda, já pedi apoio aos meus advogados, mas pode ser que um empregado que tenha alguma briga com o patrão tome uma atitude que leve seu empregador a ter problemas. Vejo esse aspecto com desconfiança”.

Segundo Salum, escândalos de corrupção não são “regra” nos contratos entre governos e empresas. “Acontece muito isso sim, mas a gente tem muita noção do lado errado, porque é o que dá notícia. Aonde não acontece fraude você não sabe. Setor público e privado têm que ter muita lisura e essa lei vai gerar jurisprudência”.

De acordo com a assessoria da Casa Civil, a lei anticorrupção é válida mesmo sem a publicação do decreto que a regulamenta, previsto para os próximos dias. Porém, a falta de regulamentação de aspectos – como os critérios para aplicação das multas, os fatos agravantes da prática ilícita e quais os mecanismos corporativos de controle de irregularidades que podem servir de atenuantes à pena – podem criar dificuldades processuais, caso alguma empresa venha a ser denunciada.
Qualquer que seja a punição, o nome da empresa deverá ser inscrito no Cadastro Nacional de Empresas Punidas (Cnep), instituído pela lei. A condenação administrativa não impede a punição individual aos dirigentes ou administradores.

“Temos conversado bastante com os representantes de Estados e municípios e há um grande interesse de que os regulamentos de todas as esferas sejam harmônicos, para evitar disparidades, confusão e insegurança jurídica”, disse o secretário de Transparência e Prevenção da Corrupção, da Controladoria-Geral da União (CGU), Sérgio Seabra.

O Hoje em Dia tentou contato com a Fecomércio-MG e com o Sinduscon-MG, mas não conseguiu contato com seus presidentes. A Fecomércio informou que “não tinha fonte, na quarta-feira, para falar sobre o assunto”. (Com Agências)
 
Autoridades não estão prontas para cumprir lei
 
Em entrevista à ‘Folha de S.Paulo’, o especialista José Compagno, sócio-líder da área de investigação de fraudes da consultoria EY, afirma que as autoridades brasileiras não estão prontas para garantir o cumprimento do decreto.

“Principalmente nos níveis estadual e municipal, há uma grande incerteza. Eu diria até que nesse âmbito de Poder, a estruturação é muito próxima de zero. Em nível federal, onde existe uma clara definição que a Controladoria-Geral da União vai fazer o monitoramento, o ‘enforcement’, há um movimento de reforço dos mecanismos de monitoramento que, na minha visão, não está num nível adequado para que o monitoramento e o ‘enforcement’ sejam suficientes”.

Ele ressalta que não há como definir prazo para que empresas e governo estejam prontos para aplicar a nova lei. “Que esses casos se transformem em uma clara mensagem de que a tolerância a atos de corrupção é muito menor. E que, como consequência disso, as empresas sejam mais cuidadosas e mais cumpridoras de seus deveres em relação à lei”.
 

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