"Lideranças tradicionais perderam seu protagonismo", afirma especialista

Patrícia Scofield - Hoje em Dia
19/06/2013 às 07:06.
Atualizado em 20/11/2021 às 19:15

Atos de protesto contra o custo dos meios de transporte em todo país, que levaram aproximadamente 250 mil pessoas às ruas, na última semana, já estão contribuindo para a mudança de postura dos governantes. A avaliação é feita pelo doutor em Ciências Sociais pela Unicamp e professor da PUC Minas, professor Carlos Alberto Vasconcelos Rocha. Para ele, as críticas em relação à Copa, entretanto, são tardias.

As manifestações estão mudando a forma de se fazer política? Até que ponto podem chegar?

Essas manifestações apresentam características inovadoras em relação aos padrões anteriores. Em primeiro lugar, no caso dos eventos atuais, a internet é um espaço privilegiado de arregimentação dos manifestantes.ideranças partidárias, sindicais e dos tradicionais movimentos sociais, que organizavam a pauta de reivindicações e mobilizavam os participantes nas manifestações tradicionais, perderam o seu protagonismo. Dessa forma, as manifestações que estamos presenciando não apresentam uma pauta de demandas definidas e, em geral, carecem de um comando com quem os governos possam negociar.

O movimento poderá se organizar a ponto de produzir efeitos e influenciar decisões de lideranças políticas?

Sim. Mas, no caso, os governos têm de fazer um esforço de interpretação da vontade popular. Os efeitos já começam a aparecer. Em Pernambuco e Porto Alegre, fala-se da diminuição do preço das passagens; o governo de São Paulo mudou sua orientação para a polícia agir de forma diferenciada da tradicional truculência; há o discurso mais aberto à negociação do prefeito de São Paulo em relação ao aumento de preço das passagens. São exemplos de uma mudança de postura que podem indicar um impacto futuro nas políticas públicas. Assim, tudo indica que mesmo com o caráter “desorganizado” dos movimentos, o governos, um tanto perplexos, buscam viabilizar respostas.

Os protestos ganharam corpo devido à atuação da polícia de São Paulo ou ela foi a “gota d’água” de insatisfações antigas?

Creio que a truculência da polícia paulista, apoiada inicialmente pelo governador de São Paulo e por meios de comunicação tradicionais, acabou insuflando o movimento. Se achavam que poderiam tratar os manifestantes como tratam a população da periferia da cidade – e aí não com balas de borracha, mas de verdade – se deram mal! Tiveram que se render aos manifestantes. Agora, no fundo, o que conta são os problemas acumulados de se viver em uma cidade caótica como São Paulo. O tempo e os recursos envolvidos em se deslocar na cidade são motivos relevantes. E protestar é um exercício de cidadania se relacionado com questões que dizem respeito à cidade.

Aparentemente apartidários, os protestos trouxeram à tona inúmeras bandeiras. Essa amplitude pode enfraquecer o movimento ou foi o que garantiu a adesão, aproveitando a visibilidade do Brasil com a Copa?

A amplitude de questões favorece a mobilização, pois cabem todas as demandas. Agora a eficácia disso poder ser questionada: coloca na agenda coisas de naturezas diversas e algumas que não podem ser atendidas. Qual o efeito de se questionar a Copa nessas alturas?

O clima de revolta poderá ser utilizado por possíveis candidatos a 2014 para atacar a situação?

Obviamente candidatos de todos os partidos buscarão capitalizar os protestos. Não somente os da oposição, em qualquer nível de governo. Quem tiver maior capacidade de fazer crer que são aptos a responder às demandas terá maiores possibilidades de transformar protestos em votos. E aí, pela natureza das demandas, os partidos mais à direita terão mais dificuldade, pois são comprometidos com interesses pouco compatíveis com os anseios populares.

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