MP-CE é proibido de questionar governo sobre contas

Fábio Fabrini
22/02/2013 às 19:42.
Atualizado em 21/11/2021 às 01:16

Procuradores que atuam junto ao Tribunal de Contas do Ceará (TCE-CE) querem processar conselheiros do órgão por proibi-los de oficiar a autoridades públicas pedindo dados para suas investigações. A polêmica decisão foi tomada na terça-feira (19) e, segundo o Ministério Público de Contas, foi uma reação contra a atuação no caso envolvendo a cantora Ivete Sangalo, que recebeu R$ 650 mil do governo de Cid Gomes (PSB) para realizar um show na inauguração de um hospital público em Sobral.

"Estranhamente, isso ocorreu logo após essa história do cachê pago no hospital. É uma consequência direta do trabalho que tenho feito nesse caso", queixou-se nesta sexta-feira o procurador-geral do MP de Contas junto ao TCE-CE, Gleydson Alexandre. Na terça, o plenário aprovou, por cinco votos a dois, decisão que veta o envio, pelos procuradores, de pedidos de informação ao governador, secretários e outras autoridades estaduais. Além disso, determinou a remessa de comunicado a todos eles, desobrigando-os de responder às solicitações.

Praxe nos MPs de Contas de todo o País, inclusive no Tribunal de Contas da União (TCU), esses requerimentos servem para os procuradores aprofundarem a análise de denúncias e fundamentarem representações contra gestores públicos suspeitos de irregularidades.

De acordo com voto do presidente do TCE, o ex-deputado Valdomiro Távora, no Ceará os procuradores precisam do aval de seu gabinete ou de algum dos conselheiros para encaminhar seus ofícios. A previsão estaria na Lei Orgânica e no Regimento do TCE, apesar da vasta legislação que prevê a transparência na administração pública.

Além da Constituição de 1988, em seu artigo 5º, a Lei de Acesso à Informação dá a qualquer cidadão o direito de requisitar dados a ocupantes de cargos públicos. Na prática, com essa decisão, qualquer cearense pode enviar solicitações ao seu governo, mas não os procuradores, no exercício do cargo.

Revolta

"Estamos de mãos atadas para levar adiante qualquer denúncia ou informação que nos chegue. Não existe essa restrição em lugar nenhum", reclama o procurador-geral, acrescentando que a liberdade de oficiar também está prevista nas leis orgânicas dos MPs de todo o País.

A situação gerou revolta na categoria, que, além de uma medida cautelar contra a decisão do TCE, já em preparação, pretende ajuizar ações de improbidade administrativa e, possivelmente, danos morais contra os conselheiros. O argumento é que a decisão violou deveres de legalidade e lealdade às instituições, além de causar dificuldades à atividade do MP de Contas. As medidas serão tomadas pelas entidades que representam os procuradores no Ceará e em nível nacional.

Em nota de repúdio, a Associação Nacional do MP de Contas (AMPCON) classifica a decisão de lamentável e desconectada da realidade. "Ao decidir embaraçar uma prerrogativa elementar do Ministério Público, atentando contra o seu bom funcionamento, o tribunal adotou postura irresponsável, totalmente contrária ao interesse público e ao dever de lealdade às instituições", diz o texto.

Para o presidente da entidade, Diogo Roberto Ringenberg, a decisão abre um precedente perigoso num contexto em que os TCEs do País são, tradicionalmente, cordiais com autoridades dos governos estaduais. Ele diz que o mal-estar político com a investigação do caso Ivete influenciou a corte de contas cearense. "O TCE está fazendo um papel de serviçal", critica.
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