A prestação de contas relativa às eleições 2014, registrada no Tribunal Regional Eleitoral de Minas Gerais (TRE-MG), contém notas fiscais da Gráfica e Editora Brasil com a mesma numeração. Os documentos são referentes a supostos pagamentos feitos pelo Comitê Financeiro do PT-MG e pela ex-candidata do partido a deputada estadual Helena Ventura à empresa. O proprietário da gráfica é Benedito Rodrigues de Oliveira Neto, o Bené, investigado pela Polícia Federal suspeito de desviar dinheiro público para campanhas petistas. São três as notas duplicadas (numerações 11049, 11035 e 11028), todas relativas à contratação de publicidade por materiais impressos. “É um erro. O comitê pode fazer uma contratação para diversos candidatos. Nesse caso, o número da nota será o mesmo para os candidatos contemplados, que devem remeter a despesa ao comitê, e não para o fornecedor”, explica o coordenador de Controle de Contas Eleitorais e Partidárias do TRE, Júlio César Diniz Rocha. Helena Ventura, no entanto, informou ter contratado o serviço diretamente com a Gráfica Brasil. Para isso, a numeração da nota fiscal deveria ser diferente e o valor do pagamento, coberto pelas receitas. R$ 36 milhões Uma das notas fiscais duplicadas, a de número 11035, é relativa a um suposto pagamento de R$ 36 milhões feito por Helena Ventura por meio do fundo partidário. A contadora responsável pela prestação da ex-candidata, Rosilene Alves Marcelino, afirmou que o pagamento milionário é fruto de um erro de lançamento. “Coloquei valor total onde deveria informar o valor unitário”. O valor correto, segundo a contadora, seria R$ 725. A nota fiscal 11035 declarada pelo Comitê Financeiro do PT-MG tem o valor de R$ 55 mil (veja infográfico). O Ministério Público Eleitoral apura os lançamentos de pagamentos feitos à Gráfica Brasil, o que inclui um pedido do PT para que o DEM, partido ao qual a contadora é filiada, seja investigado pelo alegado erro. Mistério O PT mineiro não respondeu, ao ser questionado pelo Hoje em Dia sobre quais são os outros candidatos – além de Helena Ventura – contemplados com os serviços da Gráfica Brasil. Ao todo, saíram do Comitê Financeiro do partido, nas eleições 2014, R$ 3,2 milhões destinados à empresa de Bené, todos por materiais impressos. “Quando o gasto (do comitê) beneficia mais de um candidato, a doação deve ser feita proporcionalmente à parte de cada um. Por isso, quem paga a despesa lança na sua própria prestação de contas o valor total, e o beneficiado, a parte que lhe coube. Ambos informam o mesmo número de nota fiscal”, diz nota do PT. Entretanto, a única nota com numeração duplicada é referente à Helena Ventura. BETIM – Dona da Contabilidade Shalon, Rosilene Alves Marcelino afirmou que o pagamento milionário foi fruto de um erro de lançamento. (Foto: Luiz Costa / Hoje em Dia) Helena Ventura retifica informações pessoais com novo endereço inexistente em Betim A ex-candidata Helena Ventura, alçada a pivô da confusão envolvendo o pagamento de R$ 36 milhões à Gráfica Brasil, protocolou no TRE-MG um novo endereço para ser notificada. No entanto, a numeração passada ao tribunal não existe no registro cartográfico da Prefeitura de Betim, responsável pela área informada pela petista. A Corte, no último mês, tentou notificar Helena Ventura no endereço passado inicialmente no registro de candidatura. A técnica de enfermagem de 61 anos não foi encontrada. À reportagem, a petista admitiu na última semana que sabia dos R$ 36 milhões lançados na sua prestação de contas. “Achei que não ia dar em nada”, disse. Apenas nesta semana, Helena fez a retificação do endereço e também constituiu um advogado. A falta de procuração determinando um defensor, inclusive, foi outra irregularidade de sua candidatura. O advogado nomeado por Helena é conhecido por defender processos relacionados ao PT. “Não tenho interesse algum em informar a população, apenas em defender meu cliente”, disse Wederson Advíncula Siqueira, ao ser abordado pela reportagem. Conta Documento obtido pelo Hoje em Dia revela que os R$ 36 milhões registrados na prestação de contas não passaram pela conta bancária usada por Helena Ventura durante a campanha de 2014. Ao todo, foram descontados R$ 19,9 mil entre agosto e outubro. No entanto, segundo o TRE-MG, a conta do Banco do Brasil também pode ser alvo de investigação já que nove cheques – cujo valor é exatamente de R$ 19,9 mil – foram devolvidos por falta de fundo. “Pode significar que algum fornecedor tenha ficado sem receber, o que é ilegal”, explica o coordenador de Controle de Contas Eleitorais e Partidárias do tribunal, Júlio César Diniz Rocha. Erros Além dos possíveis erros de lançamento protagonizados por Rosilene Alves Marcelino – resultando no suposto pagamento milionário e nas notas fiscais duplicadas –, a contadora pode ter falhado em outra ocasião. O Extrato de Prestação de Contas de Helena Ventura foi assinado por Rosilene, mesmo com o valor de R$ 36 milhões constando em dois pontos. “A Helena estava com muita pressa e nem li direito”. O documento também foi assinado pela ex-candidata (veja no infográfico). Em entrevista ao Hoje em Dia, a contadora afirmou que nunca havia prestado serviço ao PT, mas que era contadora do PR, em Betim. O partido informou que a comissão na cidade foi encerrada em 2011. Entrevista Rosilene Alves Marcelino ‘tive que fazer a prestação com pressa porque helena estava atrasada. peguei, imprimi e assinei. eu não cheguei a ver, nem prestei atenção que o valor registrado era de R$ 36 milhões’ Como foi feita a prestação de contas de Helena Ventura? Nunca tinha visto a Helena até a prestação de contas, em setembro. Foram três prestações de contas, a última em novembro. Ela chegou aqui muito apavorada, que ela tinha que dar entrada nisso, que tinha que dar entrada no Pimentel, pá pá pá. Veio com um muita conversa. Tinha que chegar em BH às 12h e já eram 10h. Mas como R$ 725 foram confundidos com R$ 3,6 milhões? Pois é... Uma coisa é errar para R$ 726 ou R$ 825, né?! Mas R$ 36 milhões? Um erro de digitação desses não existe. Fui conferir o que ocorreu na quinta-feira, após a Helena vir aqui, e percebi que lancei o valor total como valor unitário. Como eram 50 mil panfletos, 50 mil vezes 725 resultou em R$ 3,6 milhões. É normal ocorrer um erro tão discrepante? Não, não é normal. Foi o maior erro da minha vida. Você se filiou ao DEM em 2003. Qual sua relação com política? Ah, sobre a filiação, fui mesária há 11 anos e decidi que nunca mais iria trabalhar de graça para política. Aí falei: ‘primeiro partido que eu vir na TV, vou anotar o número e me filiar pela internet’. Então, para mim, eu era filiada até no PFL, entende?! O PFL virou DEM. Pois é, fiquei sabendo agora. Não importa para mim, só não quero trabalhar. Você nunca havia feito prestação de contas? Não. Eu sou contadora de partido político, isso eu sou. Quais partidos? Do partido. Sou contadora do... PSDB? Deixa eu ver... Porque é tanto nome, né?! A senhora não sabe para qual partido faz contabilidade? Do PR! Para o diretor do PR, ele mudou de partido recentemente. Qual o nome dele? Não vou te dar essa informação. Rosilene Alves Marcelino é contadora, proprietária da Contabilidade Shalon, e assinou a prestação de contas de Helena Ventura. A contadora afirma ter assinado, na quarta-feira, um documento escrito pela ex-candidata no qual assume a culpa pelo lançamento do pagamento no valor de R$ 36 milhões à Gráfica Brasil