Paulo Guedes é investigado na ‘máfia do combustível’

Ezequiel Fagundes - Hoje em Dia
09/04/2015 às 07:52.
Atualizado em 16/11/2021 às 23:34
 (CARLOS ROBERTO )

(CARLOS ROBERTO )

O secretário de Estado de Desenvolvimento e Integração do Norte e Nordeste de Minas (Idene) e deputado estadual, Paulo Guedes (PT), é investigado pelo Ministério Público Estadual em desdobramento da ação policial que desvendou a chamada “máfia do combustível”.

Guedes é suspeito de utilizar cupons forjados de abastecimento para obter reembolso da verba indenizatória, paga pela Assembleia Legislativa de Minas Gerais. A investigação é conduzida pelo promotor João Medeiros, da Promotoria de Defesa do Patrimônio Público de Belo Horizonte. Um dos recibos com o nome do secretário foi emitido pelo Auto Posto Amanda e Júlia Ltda, de Montes Claros (Norte de Minas), reduto eleitoral do petista.

O posto é um dos alvos da primeira fase da operação Catagênese, desencadeada em 5 de março para desarticular a “máfia do combustível”, responsável pelo desvio de pelo menos R$ 20 milhões em 19 prefeituras do Estado. O Hoje em Dia teve acesso, com exclusividade, ao cupom de abastecimento, bem como a outros cupons que possibilitam a suposta fraude.

Para instruir o inquérito, o promotor enviou ofício à Assembleia solicitando cópia de toda prestação de contas do parlamentar petista na Legislatura passada.

No valor de R$ 4.810, o gasto com o cupom de abastecimento foi coberto pela verba indenizatória.

Existem indícios, conforme a investigação, de que Guedes utilizou o recibo fraudado para embolsar o dinheiro público. Como ocorreu com os prefeitos, o abastecimento, na realidade, não teria sido realizado. Ele teria utilizado um cupom fiscal com mesma numeração de outros cupons fiscais cujos abastecimentos foram feitos em datas anteriores, por empresas privadas. Ou seja, um mesmo cupom fiscal não pode ter o mesmo número que outro.

Além de Guedes, a ex-deputada estadual Ana Maria Resende (PSDB) e o marido dela, ex-deputado federal Jairo Athayde (DEM), também estão sendo investigados pelo mesmo motivo. No caso deles, os cupons de abastecimento foram fornecidos pelo posto Antares, de Montes Claros, que também está sendo investigado no âmbito da operação Catagênese.

Como Athayde exercia mandato na Câmara dos Deputados na época dos fatos, o procedimento envolvendo o democrata foi remetido ao Ministério Público Federal (MPF), já que ele possuía foro privilegiado por prerrogativa de função.

O outro lado

Por meio de nota, o deputado Paulo Guedes refutou as suspeitas da promotoria de BH e destacou que todas as despesas com combustível são compatíveis com sua atuação parlamentar em 93 cidades do Norte de Minas. Ele declarou já ter pedido à Assembleia Legislativa que forneça ao MPE todos os cupons de abastecimento referentes ao período solicitado.

Quanto aos abastecimentos no Posto Amanda e Júlia, alvo da operação “Catagênese”, ele alegou: “é importante esclarecer que as notas emitidas pela empresa na última Legislatura (2011/2014) correspondem a apenas 29% do gasto total com combustíveis. Esse número se justifica por Montes Claros ser a cidade onde o deputado Paulo Guedes sempre manteve escritório regional, sua residência, e de onde sempre partiu para todos os municípios que visita. É importante também esclarecer que os casos isolados em que houve mais de um abastecimento por dia referem-se a veículos do parlamentar a serviço do mandato na sua base”.

Ruy Muniz culpa antecessor e diz que está colaborando

Por meio de nota, o prefeito de Montes Claros, Ruy Muniz (PRB), contestou o relatório parcial da operação “Catagênese” e culpou seu antecessor, o ex-prefeito Luiz Thadeu Leite (PMDB). Muniz nega qualquer irregularidade na sua gestão e afirma estar colaborando com as investigações.

“O relatório da operação aponta supostas irregularidades em 2011 e 2012 na ESURB”, acusou. Na época, ele não havia sido eleito. ´No entanto, o inquérito da operação afirma que a fraude foi mantida na atual administração.

Conforme a nota de Muniz, o prefeito informou: “o município está colaborando desde o início da operação”. Por fim, ressaltou que “o município tem ainda interesse na apuração da veracidade dos fatos e, se houver a comprovação de alguma irregularidade, os responsáveis serão devidamente punidos”.

Além de Montes Claros, o relatório elaborado pela Polícia Civil narra detalhes do funcionamento do esquema de fraude em combustíveis em outras 18 cidades do Estado.

Rombo

A estimativa inicial é de um rombo de pelo menos R$ 20 milhões aos cofres públicos. De acordo com as investigações, as prefeituras reembolsavam despesas com combustível que, na realidade, foram pagas por terceiros.

O golpe é possível tendo em vista que, na maioria das vezes, não é comum a emissão de notas fiscais no ato do abastecimento. Os consumidores abastecem os veículos, mas não pedem cupom.

Devido a uma brecha na escrituração fiscal dos postos, os cupons são lançados como “pendentes”. Posteriormente, eram preenchidos em nome das prefeituras.

“Laranjas” de prefeito foram beneficiados, diz inquérito

Relatório parcial da operação “Catagênese”, desencadeada no início do mês pela Polícia Civil e Ministério Público Estadual (MPE) de Minas para desmantelar um esquema de desvio de verbas em 19 cidades do Estado, revela a existência de dois “laranjas” do prefeito de Montes Claros, Ruy Muniz (PRB). Eles seriam os principais beneficiários pelas “simulações de abastecimentos” na Empresa Municipal de Serviços Obras e Urbanização (ESURB). Toda contabilidade da empresa municipal está sendo periciada para descobrir o valor desviado dos cofres públicos. O prefeito prestará depoimento em BH posteriormente, mas ainda não foi notificado.

Criada na década de 80, a autarquia da prefeitura tem patrimônio próprio e autonomia administrativa, mas é mantida pelo município de Montes Claros. De acordo com o relatório, os investigados Leonardo Andrade, secretário de Serviços Urbanos, e Cristiano Dias Júnior, presidente da ESURB, “têm participação ativa e postam-se como principais beneficiários nas fraudes impostas contra a ESURB e a administração municipal”.

Conforme o documento, obtido pelo Hoje em Dia com exclusividade, os dois são “testas de ferro” e sócios de Muniz em empreendimentos particulares do prefeito. Além de chefe do Executivo da cidade, o prefeito é empresário de vários segmentos. O papel da investigação, no entanto, não menciona em quais empreendimentos os três seriam sócios e qual o valor supostamente desviado dos cofres da autarquia municipal.

“Relatório elaborado pela Receita Estadual detectou consistentes indícios de irregularidades envolvendo transações comerciais realizadas entre a ESURB e o posto revendedor Antares Combustível, empresa com sede no Município de Montes Claros. Os elementos judiciários colhidos pela Secretaria de Fazenda são corroborados por representação formulada ao Ministério Público por vereadores locais, amparada em robustos elementos de convicção”, diz trecho da investigação.

Essa documentação serviu de base para o Tribunal de Justiça de Minas autorizar a primeira fase da operação “Catagênese”, em 5 de março.

Nesse dia, o TJ autorizou a realização dos mandados de busca e apreensão de documentos em 19 prefeituras do Estado, incluindo Montes Claros, principal cidade do Norte de Minas.

Entre as atribuições da ESURB estão a execução de obras e serviços de urbanização, a fabricação de produtos pré-moldados, a realização de obras de construção civil, o asfaltamento ou pavimentação, de qualquer tipo, de logradouros públicos e coleta de lixo.

Além do posto Antares, o outro estabelecimento investigado é o Amanda e Júlia, onde os investigadores encontraram uma nota promissória no valor R$ 1,5 milhão em nome do prefeito Muniz e da mulher dele, deputada federal Raquel Muniz (PSL), conforme o Hoje em Dia já adiantou. Em nota, eles alegaram se tratar de garantia de compra de um imóvel.

Defesa

Em nota enviada ao Hoje em Dia, o criminalista Sânzio Baioneta Nogueira, advogado do ex-prefeito de Montes Claros Luiz Tadeu Leite (PMDB), declarou que o seu cliente não possui qualquer relação com eventuais irregularidades envolvendo a Empresa Municipal de Serviços, Obras e Urbanização (ESURB). Alegou que a autarquia possui autonomia administrativa própria, devendo a atual gestão assumir a responsabilidade por seus atos. “Na oportunidade, aproveita-se para destacar que a defesa técnica de Luiz Tadeu Leite prestará todos os esclarecimentos necessários às autoridades responsáveis pela investigação noticiada na matéria, a fim de comprovar a total lisura de sua administração na Prefeitura de Montes Claros”.

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