O ano de 2012 começou com a convicção de alguns analistas políticos de que a polarização nacional entre PT e PSDB imprimiria a sua marca nas eleições municipais. Com o início das campanhas, porém, esse diagnóstico foi abalado pela força de alguns fenômenos, e o exemplo mais forte veio do desempenho da candidatura de Celso Russomanno (PRB) para a Prefeitura de São Paulo. Agora, com os resultados do primeiro turno, o argumento inicial se mostrou totalmente verdadeiro e mostra que a polarização PT e PSDB ainda imprime sua marca nas eleições. A avaliação é do cientista político da Universidade Federal do ABC (UFABC), Vitor Marchetti.
Segundo ele, a cidade de São Paulo é uma arena particularmente relevante para o argumento da bipolarização no Brasil. "Além do tamanho do eleitorado e do seu peso na economia do País, a cidade serviu de berço para boa parte das lideranças mais proeminentes de ambas as agremiações. Apesar do desempenho de José Serra (PSDB) e Fernando Haddad (PT) terem sido pouco abaixo dos padrões históricos, considerando as eleições de 2010, 2006 e 2004 o tucano sempre manteve uma votação superior a 40% e o PT acima dos 33%, a polarização inviabilizou o surgimento de uma alternativa", destaca.
Desde 2002, considerando todas as eleições majoritárias do período: prefeito, governador e presidente, diz Marchetti, o PT e o PSDB têm concentrado algo em torno de 80% dos votos válidos no município no primeiro turno, "considerando que a candidatura de Kassab em 2008 orbitou na lógica da bipolarização". Mesmo que nas eleições municipais deste ano tenha havido uma desconcentração desses votos, os dois partidos receberam quase 60% dos votos. "Por isso, ainda que detectemos fragilidades na candidatura de Russomanno, a tendência do sistema político brasileiro mostrou que a bipolarização foi a variável mais forte."
Indagado se o PSB, que terminou neste primeiro turno das eleições como a grande promessa de crescimento político, poderia romper com essa lógica, o cientista político destaca: "De fato o prognóstico de crescimento (do PSB) se confirmou. Em número de eleitores governados, o PSB saltou da oitava posição em 2008 para a quarta em 2012, de 311 prefeituras para 434 (faltando ainda o segundo turno em 50 municípios). Com destaque, obviamente, para as vitórias em Belo Horizonte, Recife e o segundo turno em Fortaleza. Mas o fato é que as três maiores forças partidárias ainda são PT, PMDB e PSDB."
Apesar de uma pequena queda em relação a 2008, explica Marchetti, o PSDB é o segundo partido em número de prefeitos eleitos (692), ficando atrás apenas do PMDB (1015). O PT, por sua vez, manteve sua trajetória de crescimento nos Executivos municipais, comprovando o seu projeto de interiorização no País. "Para se ter uma ideia, em 2000 o partido conquistou 187 prefeituras, em 2012 já foram 620." E reitera: " O cenário das eleições de 2012 não apontou, portanto, para grandes transformações no núcleo de funcionamento do sistema político. Tudo indica que o PT e o PMDB seguirão juntos em 2014 e o PSDB organizará o bloco da oposição. Para o PSB parece haver dois caminhos: ganhar mais robustez mantendo-se na órbita do PT ou construir uma nova oposição compondo com o PSDB (ao estilo BH)."
O cientista político da Universidade Federal do ABC (UFABC) cita também o PSD, partido fundado pelo prefeito de São Paulo, Gilberto Kassab, que "estreou com um número bastante considerável de prefeituras conquistadas (493), boa parte delas (72%) em cidades muito pequenas, com menos de 15 mil eleitores". Por isso, continua Marchetti, quando considerado o orçamento que o partido irá gerir, o PSD ocupa a sexta posição. E fala do DEM, que manteve neste pleito sua trajetória descendente: "Das 1026 prefeituras que conquistou em 2000, nessa eleição de 2012 conquistou apenas 276. Uma desidratação fortíssima que dará tons mais dramáticos ao segundo turno em Salvador (onde o DEM está em disputa com o PT)." Segundo o cientista político, olhando para 2014 é possível dizer que o DEM será ainda mais coadjuvante e o PSD não terá musculatura suficiente para assumir um maior protagonismo.
Com base neste cenário, Vitor Marchetti destaca que parece não haver caminho para a construção de uma oposição nacional ao PT que não passe pelo PSDB - em função ainda de sua capilaridade. "E se o diagnóstico está correto, faz sentido falarmos em algum nível de funcionamento coordenado do sistema político brasileiro."
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