A presidente em exercício do Tribunal de Justiça do Acre, desembargadora Cezarinete Angelim, decidiu nesta quarta-feira mandar para o Supremo Tribunal Federal (STF) o julgamento dos pedidos de liberdade de 14 dos 29 indiciados pela Polícia Federal na Operação G7 por considerar a maioria dos magistrados da corte suspeitos ou inaptos para votarem. A PF produziu um relatório complementar no inquérito, revelado nesta quarta, que aponta suposta relação suspeita entre desembargadores e os investigados.
No inquérito entregue ao TJ no dia 28, a PF apontou a existência de um cartel formado por empresários e integrantes do primeiro escalão do governo Tião Viana (PT), que teria fraudado contratos públicos e desviado recursos do Estado entre 2011 e 2013.
A decisão de mandar o julgamento para Brasília foi tomada por Cezarinete, monocraticamente, durante sessão do Pleno (que reúne todos os desembargadores), com discussão entre os desembargadores e a presença da polícia, em nova tentativa de votação dos pedidos de liberdade.
Durante a sessão, a relatora do caso, Denise Bonfim, revelou que a PF produziu relatório com indícios de tráfico de influência envolvendo os investigados e pessoas com relação direta com eles e seus colegas da corte e por isso eles não poderiam votar os relaxamentos de prisão.
A desembargadora leu um trecho do documento, com um relatório de dois policiais federais que acidentalmente presenciaram o desembargador Pedro Ranzi em um voo comercial, entre Brasília e Rio Branco, no dia 17 de maio, em conversa suspeita com o senador Jorge Viana (PT-AC), irmão do governador.
Tião Viana não é alvo do inquérito, mas as apurações da PF apontaram que o esquema só existia por ter a participação direta de gente de confiança do governador, entre eles dois secretários e um sobrinho - Tiago Viana, funcionário da Secretaria de Saúde.
No relatório da PF, os policiais afirmam que em um rápido diálogo os dois falaram sobre o pedido de liberdade julgado pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ), que beneficiou o sobrinho do senador, um dos indiciados. O diálogo "poderia sugerir interesse desse na decisão do STJ que concedeu liberdade provisória a Tiago Viana".
"Segundo o relatado, o desembargador Pedro Ranzi, ao acondicionar bagagem, foi abordado pelo senador Jorge Viana com o seguinte comentário. 'Precisamos conversar sobre aquele negócio', informando ao desembargador Pedro Ranzi, na sequência, que já havia conseguido a liminar", leu a desembargadora.
Os agentes afirmaram então que, "ato contínuo, o desembargador teria se manifestado de forma positiva sobre essa situação com sinalização gestual, com movimento de cabeça afirmativo pela concessão da liminar" e que depois os dois teriam se sentado lado a lado durante o voo e conversado durante 10 minutos.
Perseguido
O relatório da PF foi lido por Denise, após Ranzi se declarar apto a votar os pedidos de liberdade e acusar a PF de monitorá-lo."Eu quero antes dizer que estou sendo perseguido e monitorado pela Polícia Federal, os meus passos estão sendo seguidos e isso me causa constrangimento", afirmou Ranzi durante a sessão. O desembargador argumentou que naquela data não conhecia o caso nem a concessão de liminar, que soltou Tiago Viana - único dos 15 presos que teve a prisão cancelada.
"Eu não entendi, pela zuada do avião, o que é que era, o que é que se tratava", afirmou Ranzi. Segundo eles, os dois trataram no voo de um pedido de testemunho por parte do pai do senador, Wildy Viana, em um processo de anistia que ele vai apresentar ao Ministério da Justiça por se considerar perseguido político. Ele disse ser mentira que foi até o fundo do avião conversar com Viana. O senador Jorge Viana, por meio de sua assessoria de imprensa, não quis comentar o caso por desconhecer o teor do documento.
Relatório paralelo
A reportagem apurou que além do relatório sobre Ranzi, outro magistrado do TJ foi flagrado em conversa telefônica com um dos indiciados. Seu nome não foi divulgado. O relatório complementar da PF deve ser entregue ao STF e ao Conselho Nacional de Justiça (CNJ).
Uma equipe da Corregedoria do CNJ está em Rio Branco, desde terça-feira, 4, para uma correição no TJ do Acre, por conta dos comunicados enviados ao órgão e ao STF pela desembargadora Denise Bonfim.
Além de relatar tentativa de "usurpação de competência" por parte dos desembargadores locais, que tentam votar os pedidos de liberdade, ela comunicou ter sofrido ameaça e pediu segurança.
http://www.estadao.com.br