"Violações seguem um padrão sistemático", diz Antônio Cançado Trindade

Ricardo Rodrigues - Do Hoje em Dia
03/02/2013 às 08:16.
Atualizado em 21/11/2021 às 00:39
 (Renato Cobucci)

(Renato Cobucci)

O massacre de comunidades indígenas na Guatemala foi o processo que mais impressionou Antônio Augusto Cançado Trindade, membro da Corte Internacional de Justiça e ex-presidente da Corte Interamericana de Direitos Humanos (1999-2004). Ele concorda que a truculên-cia dos estados que perseguiram e eliminaram opositores em nome da segurança nacional, nos últimos anos cede posição à violência policial e à ganância de empresas que praticam injustiças sociais e ambientais contra a milhares de pessoas discriminadas por sua “raça”, origem ou cor.  Na lista de instituições denunciadas por violações de direitos humanos, o Brasil ocupa o quinto lugar no ranking continental, informa o Observatório de Conflitos Mineiros da América Latina.]

As violações seguem um padrão sistemático?

Não há como separar a responsabilidade penal individual da responsabilidade do Estado quando há um padrão sistemático de violações, para os perpetradores das atrocidades que agiram com o aval e apoio dos estados e seus serviços de inteligência. A jurisdição internacional fortalece as jurisdições nacionais na luta contra a impunidade, para que vítimas e familiares recuperem a fé na Justiça humana.

A Corte de Haia arbitra sobre o desenvolvimento de uma batalha decisiva para a Humanidade, diante da contaminação das águas e destruição das florestas?

Dentro de uma visão holística, os direitos humanos estão conjugados aos direitos sociais, políticos, econômicos, ambientais e culturais. Mesmo na Corte de Haia, embora o procedimento seja interestatal, não nos impede de identificar os problemas humanos afetando indivíduos e populações, de proceder ao exame das condições de vida das populações dos estados litigantes. Não se pode separar um do outro. A população é o elemento mais precioso da condição do Estado.

Como lidar com o legado de violações dos direitos em países cingidos pela impunidade e silêncio, como o Brasil?

Não posso falar sobre questões que envolvem o Brasil e nem sobre casos em julgamento pela Corte. Quando concluímos os primeiros casos relativos a padrões de violação dos direitos humanos, a Convenção Americana continha a determinação dos fatos e imputação da responsabilidade, reparação de danos às vítimas e sanção dos responsáveis.

O que mais o marcou?

A Guatemala produziu um dos mais completos relatórios sobre a ocorrência de mais de seiscentos massacres vitimando a população maia. Os próprios guatemaltecos determinaram, nos anos 1990, que era uma prática sistemática que engajava a responsabilidade do Estado.

Fujimori tenta a ressurreição política...

A Comissão da Verdade do Peru averiguou a prática sistemática de desaparecimento de pessoas, execuções extrajudiciais por parte de grupos de extermínio, financiados pelo Estado. Tive a responsabilidade adjudicar os casos de Barrios Altos (2001) e de La Cantuta (2006), que resultaram na condenação do Estado peruano. Essas sentenças foram reconhecidas no relatório da Comissão da Verdade e serviram de base para o posterior processo penal contra Alberto Fujimori.

Essas decisões repercutiram noutros países?

Na Argentina, os juízes nacionais apressaram os juízos contra os membros da Junta Militar que governou o país, responsáveis pelo desaparecimento de pessoas consideradas inimigas do regime.

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