(Maurício Vieira)
Por trás dos sonhos da aposentada Rosana Maria Almeida Cruz e do comprador Diego Gonçalves Torres, que torcem para cravar as seis dezenas da Mega Sena neste sábado, está toda uma estrutura de arrecadação de impostos, tributos e contribuições. Em queda desde 2014, o faturamento das loterias administradas pela Caixa Econômica Federal (CEF) voltou a crescer. O índice de aumento real foi de 6% no segundo trimestre deste ano, quando comparado a igual período de 2016, o equivalente a R$ 3,45 bilhões.
Como boa parte destes recursos é distribuída entre impostos e contribuições (veja infográfico), o assunto loteria é levado a sério pelo governo federal. Tanto que trimestralmente é elaborado um “Boletim de Acompanhamento do Mercado de Loterias”. Técnicos da Secretaria de
Acompanhamento Econômico (SAE), ligada ao Ministério da Fazenda, avaliaram, no documento, que este rendimento é “reflexo da recuperação da economia neste primeiro semestre”.
Otimismo contestado pelo vice-presidente do Sindicato dos Lotéricos de Minas Gerais, Frederico Barbosa. “O que aumenta a procura pelas loterias são os prêmios acumulados, o que não houve no ano passado”, informa.
Segundo Barbosa, no setor há 15 anos, em 2016 a queda no faturamento chegou a 21%. Já este ano, além do concurso 1.953, que acontece neste sábado e tem prêmio estimado em R$ 105 milhões, a Quina de São João também atraiu a cobiça dos apostadores, ávidos pelo prêmio de R$ 140 milhões.
O fato é que se a desaceleração na economia também atingiu o setor de loterias, os apostadores não perdem a esperança, somente mudaram hábitos.
Das nove loterias administradas pela CEF, a Mega Sena era a “queridinha” de quase metade (44,7%) dos apostadores. Um reajuste no valor – a aposta mínima hoje custa r$ 3,50 – fez com que muitos aspirantes a milionários migrassem a fezinha para a Lotofácil, cuja aposta mínima de 15 números em um total de 25 sai por R$2. A Lotofácil saltou de 25% para mais de 30% na preferência dos apostadores nos últimos três anos.
Privatização
De olho nesse quinhão, o governo já tem estudos adiantados e quer fazer com que a arrecadação das loterias subam dos atuais R$ 6 bilhões para R$ 12 bilhões por ano. Para isto já foi criada a Lotex, que administra as loterias instantâneas, como a raspadinha, cujo processo de privatização está previsto ainda para 2017.
Uma outra observação do governo é com relação às loterias de prognósticos esportivos. Segundo o boletim da SAE, esta modalidade representa menos de 1% do mercado lotérico do país do futebol, enquanto a média mundial gira em torno dos 7%.
Sonhos vão de ajuda financeira à família até mudança de país
Os apostadores da Mega Sena e das loterias em geral refletem o atual momento político econômico do Brasil. E mesmo apertados não deixam de jogar com frequência. A aposentada Rosana Maria Almeida Cruz não titubeia quando responde o que faria com uma conta bancária recheada de milhões.
“Ajudaria minha família”, diz Rosana, que tem 13 irmãos, 26 sobrinhos e 30 sobrinhos-netos. Muitos familiares, ela admite, dependem da sua ajuda enquanto aposentada.
Já a secretária-executiva Selma Barbosa dos Santos mantém vivo o sonho americano e não pensa duas vezes ao revelar o que faria se ganhasse. “Vou sair deste país e mandar pôr fogo no Congresso”, brinca. “Quero morar na Califórnia”, completa.
Quem também mudaria de país, desapontado com os rumos da política, é o comprador Diego Gonçalves Torres. Seu sonho é mudar para a França, parar de trabalhar e viver somente com os rendimentos do prêmio milionário.
Confirmando a tese de que as apostas aumentam quando os prêmios estão acumulados, o aposentado Geraldo Alves afirma que tinha parado de jogar por uns tempos. “Estava sem sorte”, lamenta. Cauteloso, ele diz que compraria “uma casinha melhor” enquanto aguardaria tempo para, calmamente, decidir o que faria com tanto dinheiro ao se tornar um milionário.
Filantropia
Mas há os apostadores de espírito filantropo, como o engenheiro aposentado Márcio Carneiro. “Eu ficaria com apenas 10% do prêmio. Com os outros 90% ajudaria outras pessoas”, garante. Márcio pensa em criar uma fundação que levaria o nome da mãe ou ajudaria um hospital que esteja passando por dificuldades financeiras.