(Riva Moreira)
Geraldo Santiago, um dos donos da cachaça Havana, está animado com o acordo bilateral anunciado na semana passada entre a União Europeia e o Mercosul “porque significa abertura e ampliação de mercado”. Da mesma forma, José Ricardo Ozólio, presidente da Associação dos Produtores Artesanais de Queijo do Serro, crava: “A mercadoria ficará mais valorizada, com melhor preço”.
O agronegócio mineiro está otimista com o acordo entre os dois blocos econômicos, que respondem por 25% do Produto Interno Bruto (PIB) mundial e 780 milhões de consumidores, pois várias alíquotas serão zeradas e as indicações geográficas (IG) serão valorizadas no mercado internacional.
Indicações geográficas são registros de produtos ou serviços que levam em conta o local de origem e características únicas em função de recursos naturais, como solo, vegetação e clima. Também conta o chamado “saber fazer”. Entram neste bojo a cachaça da região de Salinas (Norte de Minas), onde é fabricada a Havana, e o queijo do Serro, que reúne mais de 700 produtores de 11 municípios.Riva Moreira A gerente da AJR, Adenize Marques, acredita que o acordo pode valorizar ainda mais as marcas e melhorar as vendas também no mercado interno
“Dentro do acordo, há uma cláusula de distinção para os produtos brasileiros e, dentre eles, estão café, queijos e cachaças. O que é a distinção? A especificidade que temos de uma característica (terroir). Abre-se possibilidade de mais origens caracterizadas. Cria-se a possibilidade da identificação e promoção destes produtos. A chancela de uma caracterização geográfica possibilita a valorização. O preço ao produtor pode aumentar, pois quando o consumidor o valoriza, tende a pagar mais pelo produto”, destacou Aline Veloso economista e coordenadora de Assistência Técnica da Faemg.
É nesta valorização e na expansão do consumo que os produtores de cachaça da região de Salinas estão de olho. “A bebida ficará mais valorizada e os fabricantes poderão ganhar mais mercado”, reforçou o dono da Havana, cuja garrafa de 600 ml é vendida na porteira (diretamente da fazenda) por R$ 280.
Longe de lá, no Serro, seu Ozólio e os demais produtores de queijo estão otimistas com a valorização da indicação geográfica da mercadoria. Hoje, uma peça maturada (60 dias), que tem de 700 a 800 gramas, é negociada na região entre R$ 40 e R$ 50. “Quem gosta de queijo, vai querer o nosso”, garante o produtor da cidade do Serro.
“As indicações geográficas ajudam a proteger o nome do território. Tanto lá quanto cá, o importante é que tenhamos o registro de indicações no país”, disse Priscilla Lins, gerente da Unidade de Agronegócio do Sebrae Minas.
Para a Secretaria de Estado do Desenvolvimento Econômico de Minas Gerais (Sede), “há um otimismo para a exportação de produtos mineiros, como calçados, a carne bovina, o café solúvel, as frutas, o açúcar e os queijos. Os consumidores também serão beneficiados pelo acordo, com acesso a maior variedade de produtos a preços competitivos”.
O tratado pode ter efeitos também no mercado interno. Comerciantes do Mercado Central de Belo Horizonte, por exemplo, onde há várias lojas especializadas em queijos, cachaças e cafés, torcem pela valorização do produtos e, consequentemente, pelo aumento da demanda.
Para a gerente da loja Tupiguá, Ana Gabriela, o mercado aquecido é bom para todos na cadeia, dos produtores aos revendedores. Adenise Marques, gerente da AJR, especializada em bebida concorda. “Preços competitivos ajudam no giro de mercadoria. Estamos na torcida para que todos ganhem”.
Embora otimistas, empresários cobram reforma tributária para Estado ficar mais competitivo
Os produtores mineiros estão otimistas com o anúncio do acordo entre Mercosul e União Europeia, pois o tratado eliminará as tarifas de importação para mais de 90% dos produtos comercializados entre os dois blocos. Mas empresários alertam sobre a importância de condições para que os fabricantes brasileiros possam competir de forma isonômica com os do outro lado do Atlântico. Entre as medidas, a sonhada reforma tributária.
“Normalmente, aqueles produtos que têm tarifas mais elevadas (máquinas, equipamentos, eletroele-trônicos, veículos e têxteis) poderão ter dificuldades competitivas, pois apresentam custos mais elevados do que os europeus. Evidentemente teremos que fazer ajustes”, analisou Alexandre Brito, consultor de negócios internacionais da Federação das Indústrias do Estado de Minas Gerais (Fiemg).
Na prática, o especialista defende uma “agenda de governo mais competitiva, com uma reforma tributária que possa desonerar algumas atividades mais complexas, contribuindo para que a indústria não sinta esse acordo como uma ameaça”.
“No entanto, é importante frisar que os setores com tarifas mais elevadas terão os cronogramas de redução de tarifas mais lentos e, em alguns casos, poderá chegar a 15 anos, o que permitiria a sua adaptação ao mercado livre”, acrescentou Brito.
De acordo com a Fiemg, Minas é o segundo Estado que mais vende para o bloco europeu. Foram US$ 5,5 bilhões no ano passado. Já o comércio bilateral totalizou US$ 7,2 bilhões. O presidente da entidade, Flávio Roscoe, diz que, enquanto o acordo não entra em vigor, uma vez que precisa ser avalizado pelos parlamentos dos países, é fundamental que o Brasil avance na melhoria de seu ambiente de negócios.
“O setor produtivo brasileiro é assombrado permanentemente por custos ocultos que, em verdade, são impostos ocultos que se somam à carga tributária que beira os 40% do PIB e é uma das mais altas do mundo”, considerou.
Procurado pela reportagem para falar sobre a expectativa em relação ao acordo, o governo de Minas se pronunciou por meio de nota da Secretaria de Estado de Desenvolvimento Econômico (Sede). A pasta informou que a “análise sobre impactos da assinatura de livre-comércio entre Mercosul e União Europeia está sendo planejada e poderá contar com a ajuda da Fundação João Pinheiro (FJP)”.