Proibida no Brasil, a venda de cigarro eletrônico - ou vape - ocorre sem controle na internet e no comércio popular das grandes cidades do País. Desde 2017, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) determinou a retirada de 727 anúncios online do produto. Esse cigarro, comum na Europa e nos Estados Unidos, virou alvo de autoridades de saúde americanas após o registro de sete mortes que podem estar ligadas ao seu uso. A Anvisa tem feito uma série de audiências públicas para coletar informações sobre riscos e definir se mantém o veto.
O dispositivo funciona como vaporizador. O cartucho armazena nicotina líquida, água, aromatizantes e substâncias químicas, como glicerina e propilenoglicol, que conduzem a nicotina até o pulmão do usuário. O cigarro eletrônico ganhou espaço no mercado estrangeiro ao ser apresentado ao público, pelos fabricantes, como opção menos tóxica do que o produto convencional - especialistas dizem que isso não é verdade.
"O eletrônico também causa dependência. Preocupa existirem milhares de sabores catalogados, o que atrai muitos jovens", diz Alberto Araújo, pneumologista e presidente da Comissão de Combate ao Tabagismo da Associação Médica Brasileira (AMB). No Brasil, venda, importação e propaganda de quaisquer dispositivos eletrônicos para fumar - cigarros, e-cigarettes, e-ciggy e ecigar - são vedadas desde 2009, conforme resolução da Anvisa. Mas a venda ilegal é feita em sites, redes sociais e lojas físicas, principalmente no comércio popular.
No Brasil, um dos sites oferece a marca Juul - uma das mais vendidas nos Estados Unidos - por R$ 459, e o valor pode ser parcelado no cartão de crédito. Em outro portal, o anunciante apresenta vários kits: para fumantes iniciantes e avançados. Os preços ultrapassam R$ 650.
Os dois sites indicam um número de WhatsApp. Assim que a mensagem é mandada, são enviadas informações sobre as opções e um atendente inicia a conversa, passando orientações. A entrega em São Paulo pode ser feita no mesmo dia.
O jornal O Estado de S. Paulo optou por omitir os nomes dos sites e procurou as empresas, mas até a noite desta quarta-feira (18), não obteve resposta. A Anvisa também atua com as polícias e a Receita para identificar produtos ilegais.
Entre jovens
Segundo Araújo, estudos nacionais já mostraram que, em 2015, 0,38% dos brasileiros entre 12 e 24 anos usaram cigarro eletrônico. "Os antigos dispositivos imitavam cigarros e eram descartáveis, mas agora já há em formato de lápis, batom, caneta e até pen drive. Jovens fazem misturas e usam quantidades perigosas, que ficam tóxicas quando misturadas com óleo e acetato de vitamina E. Colocam nicotina e Cannabis (a planta da maconha)", alerta. Um cartucho equivale, em média, a 15 cigarros comuns.
"A nicotina é rapidamente absorvida e os jovens sofrem abstinência severa." O acetato de vitamina E não é recomendado para ser inalado. Ao entrar no sistema de vaporização, ele carrega gordura para o pulmão, podendo causar pneumonia rara.
Essa é a suspeita do que pode ter ocorrido com os jovens mortos nos Estados Unidos. Segundo o jornal The New York Times, o número de pessoas com doenças pulmonares graves internadas associadas ao dispositivo já passa de 450 e atinge principalmente jovens saudáveis. Conforme a Pesquisa Nacional da Juventude dos EUA, em 2017 mais de 2 milhões de alunos do ensino fundamental e médio eram usuários regulares do cigarro eletrônico. Em 2018, atingiu mais de 3,6 milhões. O presidente Donald Trump estuda banir o cigarro eletrônico.
Miguel Chatkin, da Sociedade Brasileira de Pneumologia e Tisiologia, observa que o fato de não haver número robusto de estudos que demonstrem riscos não significa que seja seguro. "É só comparar com cigarro (comum). Quanto tempo foi necessário para que os malefícios se tornassem públicos e reconhecidos?". Ele lembra que várias substâncias podem estar no vapor, como óleos, aditivos, pesticidas e até metais pesados.
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