Acima dos níveis registrados em 2014, quando o racionamento de energia era uma preocupação constante, os reservatórios de hidrelétricas do Brasil trouxeram alívio para o sistema elétrico. Mas ainda é cedo para comemorar. Segundo especialistas do setor, a baixa produção das indústrias e a retração no consumo residencial de energia no país são as principais responsáveis pela melhora.
“O racionamento já começou por meio do preço e da economia em retração”, critica o ex-conselheiro de Furnas e membro do Instituto de Desenvolvimento do Setor Energético (Ilumina), Roberto D’Araújo. “É um racionamento brando”, completa Walter Fróes, presidente da CMU Energia.
Atualmente, os reservatórios das regiões Sudeste e Centro-Oeste, que respondem por 70% da geração elétrica nacional, acumulam 28% do nível máximo. O volume não é o ideal (deveria estar em 50% pelo menos), mas é mais de 33% superior ao registrado em outubro do ano passado, quando fechou abaixo de 20%.
Por outro lado, a carga de energia do Brasil – todo o consumo do país – cai a passos largos. Em agosto, última medição divulgada pela Empresa de Pesquisa Energética (EPE), houve retração de 2,1% no uso de energia, no confronto com igual mês do ano anterior.
O resultado é fortemente impactado pelo setor industrial, cujo consumo desabou 5,6% na mesma base de comparação, a oitava queda consecutiva. No mercado livre, ambiente em que a energia é negociada bilateralmente por empresas de grande porte, a demanda caiu 4,1% no mês.
Um mês depois, em setembro, o Comitê de Monitoramento do Setor Elétrico (CMSE) do Ministério de Minas e Energia (MME) baixou de 2,5% em junho para zero o risco de déficit de energia na regiões Sudeste e Centro-Oeste. Para o diretor da Enecel Energia, Raimundo Batista Junior, descartar o racionamento sem citar a crise econômica é mascarar o problema. “Os reservatórios só se recuperaram porque a economia desabou. Portanto, não é um resultado confiável”.
Hasteamento da bandeira verde nas mãos de São Pedro
Devido à escassez de chuvas, que se arrasta há dois anos, os brasileiros já estariam vivenciando um ambiente de racionamento real se o cenário econômico fosse positivo, afirma o diretor da Enecel Energia, Raimundo Batista Junior.
Em 2011, quando a economia ia de vento em popa, os reservatórios da Região Sudeste giraram entre 58% e 88% do nível máximo. Em 2014, o melhor nível atingido foi 40,28%. Em 2015, até agora, 37,42% foi o maior índice alcançado. “Não seria possível segurar uma economia forte com esse índice”, afirma.
O coordenador do Grupo de Estudos do Setor Energético (Gesel), da UFRJ, Nivalde José de Castro, lembra que o período chuvoso começou em outubro e vai até abril. E é justamente neste período que 2016 será definido. “Resta a São Pedro decidir como ficarão os reservatórios. Se não chover o suficiente, tudo será possível”. Do contrário, o hasteamento da bandeira verde, que reduz a conta de luz, não é descartado.
Ele enfatiza que o sistema tem sido ampliado constantemente. Até o final deste ano, as usinas que entrarão em operação vão somar 3.398,6 megawatts de potência instalada, segundo relatório de fiscalização da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) divulgado neste mês. Estão contemplados empreendimentos eólicos, térmicos e hidrelétricos.
De acordo com o meteorologista do Tempo Clima PUC Minas, Heriberto dos Anjos, as chuvas em outubro no Triângulo Mineiro e no Alto Paranaíba, onde ficam os principais reservatórios do Sudeste e Centro-Oeste, estão 75% inferiores à média histórica, cenário semelhante ao de 2014. Para a semana passada e para esta, as previsões eram de precipitações mais intensas, o que deve melhorar os níveis do sistema.
Geração distribuída
Produzir energia em casa ou na empresa, injetando o excedente na rede da concessionária, é uma das saídas para aliviar os reservatórios e reduzir a conta de luz. Investir nos projetos, no entanto, ainda é caro, fator que trava o modelo de geração no Brasil. Apesar disso, Minas Gerais deslanchou neste sistema. Dos 1.125 projetos instalados no Brasil, 213 são mineiros, o equivalente a 19%.
Segundo o consultor da Loja Elétrica, Herbert Abreu, uma estação fotovoltaica capaz de produzir 300KWh por mês custa R$ 25 mil. Para produzir 150 KWh por mês são necessários R$ 15 mil. Devido ao aumento na tarifa de energia, que subiu 50% em 2015, o custo-benefício tem melhorado. Em 2012, quando esse modelo de geração foi regulamentado, o retorno do investimento previsto era de 12 anos. Hoje, caiu pela metade, e para o futuro, as previsões são de quedas sucessivas.