Rebeldes sírios impõem justiça islâmica em áreas "libertadas"

Dominique Seguel - AFP
11/09/2012 às 19:56.
Atualizado em 22/11/2021 às 01:12

  AL BAB (Síria) - Na cidade de Al-Bab, em poder de rebeldes sírios, os tribunais do regime laico do presidente Bashar al-Assad foram substituídos por um tribunal islâmico, em que o juiz Mahmoud Aqid recebe as partes envolvidas.   Abdullah, um inquilino de 54 anos, é o primeiro a ser atendido. A porta de sua casa foi danificada por um obus. O proprietário não a consertou e agora pedem o pagamento de quatro meses de aluguel atrasado. "Mesmo que me matem, não me mudarei de casa", jura Abdullah, vestido com uma longa toga tradicional e ostentando uma imponente barba.   O juiz Aqid, de 30 anos, tenta avaliar rapidamente a quantia que o inquilino pode contribuir e a compara ao preço de uma nova porta. Aí se inicia a longa busca por um acordo justo.   "Pela manhã, escuto os requerentes e, à noite, nos reunimos para examinar os casos", explica o homem que faz parte de um comitê jurídico eleito de 13 juízes e dois advogados experientes na lei islâmica.   Os insurgentes de Al-Bab, a 30 km de Aleppo, palco de combates entre soldados e rebeldes, expulsaram as tropas do regime de Assad depois de uma dura batalha no final de julho.   Respeito à lei pelos rebeldes   No primeiro mês de liberdade, esta cidade, de 80.000 habitantes antes do conflito, elegeu um conselho civil, um conselho militar e um tribunal islâmico "para dar conta dos casos até que o caos termine", explica o chefe do Conselho Civil, o engenheiro Abu Omar, de 52 anos.   Ele explica que "o tribunal foi bem acolhido porque em Al-Bab, todo mundo é sunita", o que não é o caso em toda a Síria, governada por um presidente alauita - um braço do xiismo- e onde coexistem várias confissões.   Além das desavenças da vida cotidiana, o tribunal também tem como missão fazer os combatentes rebeldes respeitar a lei.   É, de fato, o tema da segunda audiência do dia: a de um insurgente julgado por insultos e por falta de respeito quando tentava impor a ordem em uma fila formada diante de uma padaria.   Segundo Fawzi Sayeh, o chefe do Comitê Jurídico, cerca de dez casos são tratados diariamente. "Antes, os tribunais eram corruptos e os julgamentos eram determinados pela soma que cada um estava disposto a desembolsar", disse.   O antigo tribunal de Al-Bab contava com oito juízes que se baseavam em uma legislação herdada da época do mandato francês na Síria. Apenas um deles era especializado em direito islâmico, afirma o juiz Aqid, e tratava apenas de questões matrimoniais e de guarda dos filhos.   "Harmonizar" as legislações   Um de seus advogados, Abu al-Najjar, se dedica atualmente a "harmonizar a lei islâmica com a legislação em vigor". Ele não vê maiores contradições entre as duas fontes de direito, mas considera que a sharia é mais clemente. Cita como exemplo, a história de um homem condenado por homicídio culposo e liberado graças ao perdão dos pais de sua vítima.   Como seus companheiros, ele insiste no caráter provisório de seu tribunal até que os sírios tenham a possibilidade de escolher seu governo e seu sistema judicial. "Queremos nos transformar em um modelo", acrescenta, afirmando com orgulho que seu novo comitê concluiu casos que se arrastavam na justiça há anos.   No andar de baixo, em uma cela, seis prisioneiros rezam. Um deles é comandante de uma brigada do Exército Livre da Síria (ESL, rebeldes) castigado pelo roubo de um relógio de ouro na casa de um suspeito de fazer parte das "shabihhas", as milícias do regime.   O relógio fazia parte de um dote e, ao roubá-lo "cometemos um erro e violamos a sharia", confessa o comandante Abu Mohamed, detido há duas semanas.Ele se explica a seus combatentes, afirmando que o objeto representava uma tentação muito grande para homens que, como ele, pagam as munições com seu próprio dinheiro.

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