(Leli Baldissera/Divulgação)
Leli Baldissera/Divulgação
Instrutora de yoga e tantra, filósofa e colunista da revista VIP, ela defende uma reforma sexual
Levantar a bandeira do empoderamento feminino, mas não conhecer nem se apoderar do próprio corpo é deixar de tomar o poder para si, defende a escritora, filósofa, instrutora de yoga e de tantra Carol Teixeira. Dona de um discurso que impressiona pela franqueza e naturalidade com que trata a sexualidade feminina, ela estará em Belo Horizonte no próximo dia 18 para ministrar um curso de Shakti Yoga.
Desenvolvida por ela, a modalidade mescla posturas e respirações da prática milenar a técnicas da terapia tântrica. O objetivo é potencializar a energia sexual da mulher para que cada uma consiga usá-la em todas as demais áreas da vida. Colunista da revista VIP, ela falou ao Hoje em Dia sobre a história de vida, feminismo, sexualidade, respeito e sobre a importância urgente de que cada mulher descubra o próprio corpo.
Seu trabalho é muito focado na sexualidade feminina e na maneira como cada mulher deve perceber e amar o próprio corpo. Como esse tema surgiu na sua vida? Quando despertou para que essa seria sua contribuição?
Cresci numa família totalmente matriarcal, minha mãe foi a mulher mais forte que conheci. Então, o poder feminino foi algo que incorporei desde cedo como um fato. Até demorei a entender o feminismo na adolescência porque vivia nessa bolha em que a mulher podia tudo. Sempre trouxe essa questão, mesmo escrevendo para homens na revista Vip. Via o quanto as mulheres precisavam desse empoderamento e, como filósofa e escritora, as ajudava com meus escritos, livros e palestras. Num determinado momento, o tantra, que já estava na minha vida há seis anos, me pareceu um ótimo instrumento para ajudá-las nessa busca. Percebi que esse empoderamento, que é tão falado e está tão presente em discursos, precisava transcender a esfera intelectual para se dar de fato. Precisava ir para o corpo. Foi, então, que dei uma palestra no TEDx com o tema “O empoderamento precisa passar pela vagina”. Lembro que saí do palco pensando: se estou falando que o empoderamento precisa passar pelo corpo, preciso ensinar as mulheres a trazer isso para o corpo. Resolvi dar meu curso tântrico, o “I love my pussy”. E todos os cursos tântricos seguiram a partir dali. São a parte vivencial da minha filosofia.
A propósito, seus treinamentos e workshops são voltados só para mulheres ou homens podem participar?
Alguns são só para mulheres, outros, mistos ou só para homens.
Como funcionam os que são voltados para homens? Têm o mesmo propósito dos que se destinam às mulheres?
São diferentes. Homens e mulheres são estragados pelo patriarcado de formas diferente. Nós fomos alienadas do corpo, da intimidade com nosso corpo. Os homens, ao contrário, foram incentivados desde cedo à intimidade do corpo, mas foram afastados da expressão da emoção. Com os homens, tento trazer isso, a conexão com a vulnerabilidade da qual eles foram afastados pelo patriarcado.
Na prática, como isso se dá?
Procuro aproximá-los de uma visão mais sagrada do feminino. A chamada do curso é ensiná-los a tocar a mulher tantricamente. As vivências proporcionam uma aproximação do sagrado feminino. É muito bonito. Eles saem modificados internamente. Meus cursos têm muito choro, são muito emocionais. No último, todos saíram chorando muito, contando que ressignificaram a visão em relação ao feminino. Fico muito feliz, me emociona bastante.
Você diz que o empoderamento feminino passa pela ressignificação da vagina. Por quê? Uma mudança de postura e a própria recolocação da mulher na sociedade passam pela visão que cada uma tem da própria sexualidade?
Vejo que tem muita mulher que se diz empoderada, que faz textão feminista no Facebook, que vai a manifestação com plaquinha “meu corpo, minhas regras”, mas que entre quatro paredes ainda finge orgasmo. O discurso de empoderamento, às vezes, fica só na fala. O que proponho é levá-lo para o corpo, sentir esse empoderamento. O que nos foi negado ao longo da história foi justamente nosso contato com o corpo, com nosso órgão sexual. Aprendemos que nosso corpo é para o outro, uma vagina para o outro, uma sexualidade para o outro. Eu tento mostrar que esse corpo é para nós mesmas. E essa posse do próprio corpo passa pelo autoconhecimento sexual. Para mim, esse é o maior grito feminista: ir contra todos uma história de alienação do corpo feminino.
Como diferenciar sexualidade de sexo? Muita gente, num primeiro momento, no primeiro contato com seu trabalho, pode pensar que você esteja levantando bandeira sobre sexo, quando, na verdade, não é isso...
Minha ideia é usar a energia sexual (que é energia vital) como autoconhecimento e mostrar o corpo como instrumento de poder. A maioria entende bem minha proposta, mas se tem alguém que chega nos meus cursos achando que vai só se aprimorar sexualmente ou vai só aprender técnicas para orgasmos múltiplos tântricos logo entende que eu não estou ali para apimentar a vida sexual, mas para mudar a vida. Essa pessoa sai dali com uma visão totalmente diferente do corpo e da sexualidade.
E o que exatamente você quer dizer quando fala sobre ressignificar a relação com a própria vagina?
Significa entrar em contato com seu centro de poder feminino, entender o sagrado do seu corpo, entender que a vagina não é para o outro, mas para você antes de tudo. Isso empodera, cria um respeito pelo corpo como instrumento de poder, aumenta a autoestima, o respeito por si mesma. Utilizo meditações tântricas para desbloquear emoções e limpar crenças limitantes que impedem a expansão. Só depois trabalho sexualidade e reconexão com o órgão sexual.
Você acha que os homens, de maneira geral, têm uma relação muito mais bem resolvida com o pênis do que nós, mulheres, com a vagina?
Com certeza. Eles são autorizados a ter essa relação tranquila, são autorizados a amar o pênis. Nós aprendemos a não gostar de nossas vaginas.
Você também propõe uma reforma sexual. Do que se trata essa reforma?
Está tudo errado no terreno da sexualidade porque vivemos numa sociedade falocêntrica patriarcal. As mulheres gozam muito pouco porque o ritmo que dita o sexo é o do pornô, o da visão masculina. O que eu proponho é trazer a visão tântrica, que é matriarcal e que traz mais prazer para todos. Um sexo que vem da presença, da percepção sutil, que vai no contrafluxo desse sexo rápido, ansioso e insatisfatório que muita gente tem.
E o Shakti Yoga, o curso que você trará a BH, como funciona, a quem se destina?
Pratico yoga há dez anos e sou também formada em yoga. Sempre fiz experiência unindo técnicas de yoga com meditações tântricas e técnicas da terapia tântrica. Com o tempo deu vontade de partilhar isso. Então, nessa parceria com a Premananda School criei esse workshop Shakti Yoga. As vivências, através de pranayamas (respirações), asanas (posturas), meditações ativas e uso de yoni eggs trabalham a potencialização da kundalini e a tomada de consciência do poder da energia sexual/vital. Ensino a reconhecer esse poder através dessas técnicas. É um curso aberto a todas as mulheres, quem pratica e quem não pratica yoga também. Arquivo PessoalVIVÊNCIA COMPLETA – Shakti Yoga ajuda mulheres a tomarem consciência do poder da energia sexual
O que são yoni eggs e qual a contribuição deles para a mulher?
O objetivo é aproximá-las daquilo que foram afastadas, do centro de poder, que está na vagina. Os yoni eggs colocam a mulher em contato com isso, com o útero, com a vagina, com o chákra básico, na região pélvica, na região do genital. Também têm o benefício de funcionarem como pompoarismo, fortalecendo o músculo da vagina. Tudo é uma consciência da vagina, consciência que a mulher não tem. Às vezes nunca olhou para a própria vagina. O objetivo do meu trabalho com a mulher é esse. Os yoni eggs acabam sendo um instrumento essencial nessa busca.
Qual a importância do material com que são feitos, o cristal?
O principal benefício é que são um cristal e a energia próxima do centro de poder é muito forte. Escolhendo a pedra certa conforme as questões que deseja trabalhar, o cristal é algo muito poderoso de se colocar ali.
As posturas da Shakti Yoga podem ser feitas por qualquer pessoa? Em quê elas se diferenciam de outras modalidades do yoga? Pode falar um pouco mais sobre os benefício que proporcionam para essa redescoberta da sexualidade?
[É um processo muito mais interno do que físico. Foco mais nas pranayamas, as técnicas respiratórias do yoga, do que necessariamente nos asanas. Uso, sim, algumas posturas que possibilitam a abertura do centro de poder feminino. Mas foco mais ainda na respiração, que acredito ser a chave para a liberação de emoções e traumas e para que possamos chegar a uma sexualidade fluida e, em última instância, ao poder que desejamos.
O curso tem algum diferencial prático em relação a uma aula tradicional?
Na shakti usamos o vibrador junto com alguns pranayamas. A mulher está sentada, numa postura meditativa, fazendo uma respiração que indico, e em alguns momentos usa um vibrador, por fora da roupa mesmo, nada invasivo. O objetivo é colocar uma vibração no períneo, de forma que impulsione e facilite a ascensão da kundalini. Misturamos meditações ativas, tântricas, vibracionais, com pranayamas muito poderosos. Acabo trazendo a busca pelo sagrado feminino.
E o “I love my pussy”, do que se trata?
É meu curso de empoderamento através do tantra. Nele trabalho especificamente a reconexão com a vagina. É um dia inteiro ou um retiro e se divide tem três fases: a destruição das crenças limitantes sobre o corpo, a aceitação do amor por si mesma e o trabalho da sororidade. Por fim, trabalhamos a sexualidade como fonte de poder. Ensino as meninas até a se masturbarem com técnicas tântricas, de forma que potencializem essa energia.
Sororidade é outra palavra muito usada atualmente. Pode falar mais sobre essa etapa do curso?
É o apoio das mulheres, é parar de competir. Porque aprendemos a competir pela atenção dos homens e isso está muito arraigado entre a gente. Vejo mulheres muito poderosas, empoderadas, e que ainda competem, que ainda têm esse resquício que o patriarcado registrou na nossa mente. Tento trazer amor entre as mulheres, apoio, despertar essa sensação de que estamos juntas, de que podemos contar umas com as outras. Tento estimular esse carinho. Uso algumas meditações ativas tântricas. Mas antes de qualquer coisa trabalho o arquétipo da mãe.
O que seria isso?
[A primeira conexão com o feminino que temos é o contato com a mãe e isso tem que estar muito bem resolvido na nossa vida, independentemente se brigamos ou não com a mãe. É preciso se reconectar com o arquétipo materno. A principal meditação que faço para abrir o momento da sororidade tem relação com esse arquétipo. É difícil descrever porque tantra é vivencial.
Seu TCC em filosofia foi sobre sexualidade como afirmação de vida. Você acredita que a mulher só se realiza por completo, só se “afirma” na vida, quando descobre a própria sexualidade e se vê livre de medos e crenças?
Com certeza. Essa é a verdadeira revolução feminina, é ela se permitir ter prazer e descobrir o poder do próprio corpo, algo que lhe foi negado desde a infância. Nasce uma nova mulher quando ela descobre o próprio potencial e isso reverbera em todas as áreas da vida dela.
O que é, pra você, uma vida poderosa do ponto de vista do feminino?
Uma vida de consciência do próprio corpo, de aceitação do poder individual, de imposição de limites sem medo de parecer chata ou desagradável (aprender a dizer não é uma das maiores formas de empoderamento também). É transcender os papéis socialmente corretos do feminino e saber que todas as escolhas estão nas nossas mãos – e que só cabe a cada uma de nós fazer o mundo entender isso.