Casas tradicionais recém-desocupadas por inquilinos passaram a ser alvo de ocupações de sem-teto na Vila Mariana, bairro de classe média alta da zona sul de São Paulo. O primeiro caso foi registrado em dezembro. Hoje, o bairro já soma pelo menos seis invasões. Um dos imóveis, um casarão com 400 m2 de área construída, é avaliado em R$ 5 milhões.
Os participantes das ocupações dizem não fazer parte de nenhum movimento organizado de moradia. Coordenadores da Frente de Luta por Moradia (FLM) e do Movimento de Trabalhadores Sem-Teto (MTST), duas das maiores organizações que atuam na cidade, disseram desconhecer esse novo tipo de ocupação. "O padrão da maioria dos movimentos é ocupar grandes prédios ou terrenos ociosos, que são usados para especulação imobiliária. Por parte dos movimentos, esse tipo de invasão não deve ocorrer, mas não condenamos essa iniciativa. Ela é produto do desespero das pessoas que não têm como pagar aluguel", afirmou Guilherme Boulos, membro da coordenação do MTST.
A maior parte dos sem-teto ouvidos pelo Estado fazia parte da antiga ocupação de um terreno na Avenida Bernardino de Campos, no Paraíso, a poucos quilômetros das casas invadidas. No final de 2012, o proprietário do terreno entrou com ação de reintegração de posse e as dezenas de famílias que lá viviam tiveram de deixar o local.
"Desde então, a gente ficou vivendo na rua, procurando outros lugares para ocupar. Como não achamos nenhum terreno grande como aquele, fomos nos dividindo em casas menores", conta o catador de recicláveis Tiago dos Santos, de 26 anos, que há pouco mais de 15 dias vive com a mulher, os cinco filhos e outras 14 famílias em um casarão invadido na Rua Morgado de Mateus.
Localizado em um terreno de mais de 700 m2, o imóvel ficou locado por 38 anos para uma sauna gay e foi desocupado em fevereiro. No mês seguinte, as famílias ocuparam o local. "Errado é, mas o que vamos fazer? A gente faz o cadastro nesses programas de moradia e não é chamado nunca", diz Santos.
Proprietário do imóvel, o empresário Augusto Pellegrino, de 75 anos, diz ter ficado surpreso ao saber da invasão. "Nunca imaginei que isso fosse acontecer em um imóvel particular com uma placa de aluga-se. Essa residência pertencia aos meus pais, não queria vendê-la, mas já estou considerando a possibilidade de demoli-la, porque parece que está ficando muito danificada", disse ele, que entrou com ação de reintegração de posse.
Outros casos
A cinco quadras dali, na Rua Humberto I, duas casas de estilo arquitetônico que lembram as tradicionais casinhas coloridas de bairro foram ocupadas na mesma época do casarão. Até o ano passado, as duas abrigavam um brechó e uma agência de comunicação.
"Os sem-teto primeiro tentaram invadir os casarões comprados por uma construtora, que ficam do lado das casinhas, mas foram tirados de lá e pularam o muro", conta a chefe de cozinha Gisele de Assunção, de 33 anos, que tem um restaurante na casa ao lado dos imóveis ocupados pelos sem-teto.
Outras 15 famílias vindas da ocupação da Bernardino de Campos acabaram se instalando em um sobrado da Rua França Pinto. "A gente não teve nenhuma assistência quando saiu do terreno. Prometeram auxílio-aluguel, mas nunca recebemos nada. E as crianças já tinham tudo aqui na região, escola, creche, posto de saúde. A gente não ia conseguir essas coisas se fossemos para um bairro muito longe", afirma a doméstica E.C., de 33 anos, que está na casa há dois meses. Ela vive no local com oito dos seus dez filhos.
Os dois primeiros imóveis a serem ocupados no bairro, ambos na Rua Joaquim Távora, já foram esvaziados, após reintegração de posse (mais informações nesta página).
A Secretaria Municipal da Habitação afirma que, na época da reintegração de posse na Bernardino de Campos, a Justiça determinou que a Prefeitura apenas identificasse as famílias que ali viviam. Na época, a secretaria ofereceu encaminhamento para abrigos às 36 famílias cadastradas. "Não houve determinação judicial para atendimento com auxílio-moradia", disse a pasta, em nota.
As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.
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