Popularmente chamada de infecção generalizada, a sepse é um dos males que mais fazem vítimas nos leitos de hospitais públicos no país. Complicação silenciosa e pouco conhecida pela população, mata mais que infarto agudo do miocárdio e câncer. Dados do Instituto Latino Americano da Sepse (Ilas) confirmam: por ano, são cerca de 670 mil pacientes infectados no Brasil; mais da metade morre.
Na contramão da média brasileira, porém, os registros de óbitos por sepse no Hospital João XXIII ficaram abaixo das taxas dos pronto-socorros de outras instituições públicas do país – 51,7% em 2015.
Vale frisar que o número geral de mortes por infecção generalizada aumentou em todo o Brasil. Em 2014 morreram 46,4% dos pacientes internados.
Nos dois últimos anos, o HPS João XXIII conseguiu reduzir a taxa de 46,4% para 41,8%. Os dados são também do relatório anual do IIlas. De acordo com o órgão, os níveis de mortalidade no Brasil ainda são altos e chegam a 70% em algumas regiões. A média de óbitos considerada aceitável é de 30%, e já ocorre nos hospitais particulares nacionais (28%) e em países desenvolvidos como a França, os Estados Unidos e o Canadá.
A enfermidade
A sepse é uma resposta inflamatória do próprio corpo a uma infecção que está afetando o paciente. Diretor-técnico do João XXIII, Leonardo Paixão explica que essa reação desmedida ataca o organismo da pessoa em vários sistemas, como o respiratório, o cardiovascular e o hepático.
“Dizemos que o paciente tem sepse quando ele já tem uma infecção, como uma pneumonia, ela fica mais séria e deixa de afetar só um órgão e se espalha pelo corpo. Para combater, o organismo desencadeia uma série de respostas inflamatórias que, em vez de ajudar, começa a atrapalhar o paciente”, diz o médico.
Por isso, a sepse acompanha, muitas vezes, outros males. Em um hospital especializado em traumas é comum as pessoas serem facilmente infectadas, como observa a enfermeira responsável pelos protocolos clínicos do HPS, Laura Borja. “Se o paciente cai de moto, tem uma fratura exposta e o osso dele ralar no asfalto, ele vai chegar aqui com um risco de infecção altíssimo, mesmo que os cuidados sejam administrados rapidamente”, frisa.
Via-crúcis
E agilidade é fundamental para salvar a vida de quem está com infecção generalizada. Que o diga o aposentado Waldemar Martins Filho, de 71 anos. Em abril deste ano, ele caiu e fraturou o fêmur. Depois de passar por uma cirurgia e recuperar o osso, o idoso chegou a ir para casa, mas não andou mais. Um machucado no calcanhar o levou novamente para o hospital pouco tempo depois.
Até saber o que estava acontecendo, Waldemar foi internado em sete unidades de saúde. Por conta do tempo que levou para o diagnóstico, a infecção nos pés evoluiu para algo mais sério.
Só no HPS João XXIII, há cerca de 40 dias, é que os médicos descobriram a sepse, e o tratamento foi iniciado imediatamente. Ele pôde, finalmente, voltar para casa em 1º de novembro.
Agora, com o pé deformado por conta da sepse, o idoso terá que passar por mais cirurgias. “Eu só fico deitado, não consigo mais andar, apesar de meu fêmur estar curado”, diz.
Com sintomas parecidos com os de outras doenças, procurar o médico é fundamental
Febre alta, cansaço, fraqueza, falta de ar e tremedeira são alguns indícios de que a pessoa pode estar com infecção generalizada. Como os sintomas são comuns a outras pat[/TEXTO]ologias, é preciso ter atenção redobrada. É essencial procurar um médico para identificar as inflamações e administrar imediatamente os antibióticos adequados contra os males. Caso não seja tratada rapidamente, a sepse pode matar em poucas horas.
Cristiano Machado/ N/ATRATAMENTO – Cuidados devem ser imediatos, afirmam Laura Borja e Leonardo Paixão
“A primeira coisa que a gente faz para reconhecer a sepse é pensar nela. Por isso, orientamos toda a equipe médica, farmacêutica, laboratorial e de enfermagem a prestar atenção aos sinais”, diz o diretor-técnico do Hospital de Pronto-Socorro (HPS) João XXIII, Leonardo Paixão.
Se o paciente apresenta dois sintomas ou mais já pode ser infecção generalizada, reforça a enfermeira responsável pelos protocolos clínicos da unidade de saúde, Laura Borja. “Se é apenas uma febre, não quer dizer nada. Mas se ele tiver febre, tremor e falta de ar, já quer dizer muito no diagnóstico”.
Por isso, a equipe do hospital mineiro é treinada para, assim que houver a suspeita de sepse, realizar exames de sangue e iniciar imediatamente o tratamento com antibiótico, após a prescrição médica. O protocolo deve ser seguido no intervalo de uma a três horas.
Para melhorar ainda mais os índices e reduzir para 30% a taxa de mortalidade, Leonardo acredita que a prática das medidas precisa ter maior adesão entre a equipe, que recebe treinamentos constantes. “Precisamos capilarizar essas orientações e envolver todo mundo. Além de melhorar, devemos sustentar as melhorias, e esse é nosso desafio para os próximos anos”, afirma o médico.
Desempenho
Manutenção de protocolos clínicos para a abordagem dos casos de sepse, treinamento contínuo da equipe multiprofissional e monitoramento diário desse mal são considerados pela direção do Hospital de Pronto-Socorro (HPS) João XXIII como fundamentais para os índices baixos de mortalidade por infecção generalizada na unidade.
Os profissionais da unidade de saúde, principalmente médicos e enfermeiros, são capacitados a cada seis meses. O treinamento também se estende aos funcionários do laboratório e farmácia do hospital.
De acordo com a Comissão Central de Protocolos Clínicos da Fundação Hospitalar de Minas Gerais (Fhemig), que gerencia o HPS, nos últimos oito anos o protocolo de sepse é uma prioridade gerencial da rede.