Sidiel Vieira despencou no ninho sem nem saber como funcionava o bicho de quatro cordas e nenhuma cabeça que lhe jogaram nas mãos. Disseram que era um contrabaixo, mas nada tinha do contrabaixo que ele havia visto com Aston Barret, o baixista de Bob Marley. O que o levara ali para um teste de admissão na Escola Municipal de Música era justamente os graves do reggae Stir it Up, mas ninguém ali parecia muito comovido com sua história. "Toca o que você sabe", pediu um professor. Ele não sabia nada, mas algo no modo como segurava o instrumento sensibilizou seus avaliadores. "Ok, passou, está aprovado."
Já que era para brincar na lama, Sidiel se lambuzou. Vítima de um equívoco cheio de boas intenções da irmã Silmara, que o inscreveu no curso sem saber que baixo elétrico e acústico só são iguais no número de cordas e no de calos que fazem brotar na ponta dos dedos, ele se tornou em pouco tempo um dos músicos mais promissores de sua geração.
Aos 32 anos, depois de colocar-se a serviço de Johnny Alf, Alaíde Costa, Elza Soares, Raul de Souza e Filó Machado, Sidiel promoveu-se a band leader e escreveu um álbum a ser degustado com os olhos fechados.
Mais do que em discos instrumentais de pianistas ou guitarristas, os baixistas saem em uma vantagem quando rompem com o comportamento historicamente passivo da categoria, saem da cozinha e se lançam como compositores. Como escrevem as melodias principais para, em geral, os outros executarem, separam e deixam evidentes automaticamente suas qualidades de autores e de instrumentistas. Assim, Sidiel também ganha.
Enquanto o baixista não cai nas armadilhas do ego - preferindo o caminhar do walking bass e as paredes do groove aos solos intermináveis - as linhas melódicas que escreve têm forte acento jazzístico sem se prenderem a padrões. Aos Mestres Baixistas do Samba Jazz, por exemplo, segue o enunciado do título irrompendo o suingue dos metais de um solo de baixo. El Sidi é ágil, vibrante, expondo uma habilidade que Sidiel tem para escrever para trompetes em ebulição que pode se explicar em sua própria história. "Eu sou um trompetista frustrado." E Tenebroso é groveada no melhor estilo cru fusion de um Stanley Turrentine, invertendo as sensações pregressas da belíssima e introspectiva Sete Vidas.
Outros acasos do destino trouxeram Sidiel até aqui. Quando se apresentava na casa de shows All Of Jazz, em Moema, zona sul de São Paulo, ainda apenas como acompanhante, foi observado em detalhes por um cliente solitário de uma das mesas. Depois de tocar, veio a abordagem. "Você gostaria de gravar um disco comigo?", disse o desconhecido. Em tempo de duvidar até do próprio instrumento, Sidiel disse sim com um pé atrás. Saiu de lá e ligou para um amigo em busca de referências. "O cara é quente, manda ver", ouviu de sua fonte.
SIDIEL VIEIRA QUINTETO - Myspace/Sidielvieira - PREÇO MÉDIO: R$ 20
As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.
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