No jornalismo de economia, os gráficos são peças utilíssimas. Não é sempre, mas muitas vezes valem mais que mil palavras. Na sexta-feira, o Hoje em Dia publicou um gráfico muito didático, produzido pelo infografista Dum para ilustrar matéria do repórter Raul Mariano sobre o corte da Taxa Selic (o juro básico da economia). E, ontem, foi publicado outro gráfico muito interessante, produzido por César para matéria da repórter Tatiana Lagôa que analisa a evolução dos juros e da inflação.
Se você perdeu, as duas boas matérias e seus respectivos gráficos podem ser acessados pelo portal do Hoje em Dia. A primeira traz o título “Corte na Selic não altera quadro econômico e juro real continua elevado”, e a segunda, “Inflação menor traz cobrança por flexibilização nas políticas fiscal e de juros”. Garanto que valem a pena. Não reproduzirei os gráficos aqui por falta de espaço, mas as informações comparadas que trouxeram merecem alguns comentários. Vamos lá.
A matéria sobre a Taxa Selic – que na semana passada foi cortada pelo Comitê de Política Econômica (Copom) do Banco Central em 0,25 ponto percentual, para 14% ao ano – é ilustrada com um gráfico que compara os juros reais praticados em uma série de países, incluindo os quatro Brics (Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul). Juro real, no caso, é a taxa básica de juro de cada país menos a inflação acumulada em 12 meses. E adivinhem quem encabeça a lista com o maior juro real do mundo? Isso mesmo, o Brasil, com juro de 8,25% ao ano. Trata-se de quase o dobro do praticado pela Rússia, a segunda colocada, com 4,27%.
Também chama a atenção o fato de apenas 13, dos 35 países que constam do levantamento da Infinity Asset Management, praticarem juro real positivo. Em outros 24 países, os juros são negativos, e na Polônia é de 0%.
A taxa básica de juro é o principal instrumento utilizado pelos governos para controlar a inflação e a liquidez da economia.
Teoricamente, ela deveria subir quando o crescimento da demanda pressiona a inflação para cima. Ou seja, serviria para desacelerar um crescimento de consumo que não é suportado pela capacidade instalada das indústrias. Mas deveriam baixar quando essa demanda cai substancialmente e é preciso incentivar o consumo e os investimentos das empresas na elevação da capacidade instalada, o que é importante para que elas possam suportar o próximo ciclo de crescimento.
Pois, hoje, no Brasil, temos a situação paradoxal (para não dizer surreal) do juro mais alto do mundo em uma economia em queda livre.
Qual o sentido disso? De acordo com os xiitas da ortodoxia que comandam a economia, o problema está na inflação ainda não controlada. Vamos então ao segundo infográfico, da matéria sobre inflação. Ele mostra que, apesar da inflação no acumulado de 12 meses ainda estar alta, contaminada principalmente pelos reajustes dos preços administrados no início do ano, a inflação mensal está em queda livre desde maio, atingindo em outubro o piso de 0,19%, a menor taxa para o mês desde 2009.
O infográfico também mostra a evolução trimestral do PIB desde 2014 (acumulado em 12 meses) até o trimestre terminado em junho, o último disponível. No primeiro trimestre do ano passado, a economia passou para o campo negativo e a queda vem se acentuando desde então, até chegarmos ao mergulho de -4,9% nos 12 meses que vão de julho de 2015 a junho de 2016, comparado ao mesmo período imediatamente anterior.
O que deveríamos esperar de um Banco Central diante da recessão que se aprofunda e de uma inflação em forte declínio? Logicamente, um corte substancial na taxa básica de juro como forma de injetar algum ânimo na economia. Mas, o que fez nosso Copom na reunião da semana passada foi um corte que não compensa sequer a queda da inflação. Como já disse que juro real é juro básico menos inflação, o que vemos hoje é crescimento desse juro por conta da queda do IPCA. Cortar a Selic em 0,25 ponto percentual é ilógico e risível, mas está dentro do esperado de uma equipe econômica ultraconservadora.