(Jaciclene Valéria da Silva /Divulgação)
Em decisão inédita, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) autorizou a penhora de 30% do salário de um belo-horizontino que recebia mais de R$ 20 mil líquidos e devia ao concunhado. De acordo com o STJ, o valor é alto e permite que o devedor mantenha a dignidade, conforme determina a lei. A decisão não tem efeito imediato de jurisprudência, mas, segundo especialistas, serve para balizar o mercado.
Vale ressaltar que, antes de chegar ao STJ, o assunto foi discutido em diversas turmas, com decisões divergentes.
Sob o ponto de vista legal, o salário é impenhorável, tanto conforme a Constituição, tanto como prega o antigo Código de Processo Civil (CPC). No CPC novo, porém, quando o devedor ganhar mais de 50 salários mínimos, o equivalente a R$ 47,7 mil, o excedente pode ser utilizado para quitar alguma dívida.
“O Código de Processo Civil de 2015, no artigo 833, trouxe previsão expressa e absoluta sobre a impenhorabilidade do salário como regra geral e estabeleceu apenas duas situações excepcionais: pagamento de dívidas alimentares oriundas do Direito de Família ou decorrentes de ato ilícito e valor do salário que exceder a 50 (cinquenta) salários mínimos, para pagamento de dívidas de qualquer natureza”, explica Cristina Buchignani, sócia da área trabalhista do Costa Tavares Paes Advogados.
Posicionamentos
Até o fechamento desta edição, a pessoa que ingressou com a ação não havia se posicionado. O advogado do devedor, Hélcio Geraldo de Oliveira, confirmou que recorreu ao Supremo Tribunal Federal (STF), mas vai esperar a decisão da instância máxima para se pronunciar.
Na avaliação do especialista em Direito Civil e sócio do Teixeira Fortes Advogados, Munir Argentim, a decisão foi tomada a respeito de um fato específico e teve como base o fato de o salário, após o desconto, não afetar o “mínimo existencial e a dignidade, segundo determina a lei”.
De acordo com ele, a decisão ainda não obriga que os tribunais de instância inferior o acompanhem. “A tendência é a de que os tribunais de Justiça apliquem o entendimento desse julgado (do STJ). Mas a decisão ainda não vincula os tribunais de justiça”, diz.
Cautela
O sócio do Peixoto & Cury Advogados e especialista em Direito Trabalhista, Carlos Eduardo Dantas Costa, afirma que a decisão requer muita cautela. “Ela é perigosa porque partiu do princípio de que o salário do devedor era alto o suficiente para que ele pudesse ser reduzido sem que ferisse a dignidade da pessoa. Mas isso é muito subjetivo. Quem ganha R$ 20 mil, se organiza para viver com R$ 20 mil”, pondera o especialista.
Novo CPC
Em vigor desde 2015, o novo Código de Processo Civil determina que se uma pessoa recebe R$ 50 mil por mês, R$ 2,3 mil podem ser utilizados para quitar dívidas, sejam elas bancárias, com empresas ou, até mesmo, pessoais. O montante representa o valor que supera os 50 salários mínimos, conforme o novo CPC.
De acordo com a sócia do escritório Chenut Oliveira Santiago e especialista em Direito Empresarial, Paola Karina Ladeira Bernardes, a nova determinação vale, também, para dívidas trabalhistas. Para que isso ocorra, no entanto, deve haver desconsideração da pessoa jurídica, ou seja, os bens da empresa e da pessoa física devem ser considerados unidos.
Ela explica que isso só ocorre, no entanto, quando há suspeita de fraude. “Quando os sócios colocam bens da empresa em nomes deles, por exemplo”, diz.