Tragédia em Brumadinho completou 5 anos em janeiro (Maurício Vieira / Hoje em Dia)
Os familiares de quatro vítimas do rompimento da barragem em Brumadinho, uma delas um bebê em gestação, entraram com uma ação na Justiça exigindo, entre outros pontos, uma indenização de mais de R$ 40 milhões da Vale. Camila Taliberti, o casal Luiz Taliberti e Fernanda Damian e o bebê que a mulher esperava, Lorenzo, morreram quando estavam hospedados em uma pousada no caminho dos rejeitos da barragem da mina de Córrego do Feijão, que se rompeu em 25 de janeiro deste ano.
Em entrevista ao Hoje em Dia, o advogado Roberto Delmanto Júnior, que assina a ação junto de Paulo Thomas Korte, afirmou que o valor pedido foi baseado em um cálculo feito pela própria Vale, em relatório de planejamento de gestão de risco, que atribui à vida de cada vida humana o valor de US$ 2.562.783,28, o que, na cotação atual, representa pouco mais de R$ 10 milhões. "O que pedimos na ação nada mais é do que o valor que a própria empresa afirma que tem uma vida humana. Esperamos que nosso processo sirva de exemplo para os familiares das outras vítimas também recusem acordos pífios", defendeu.
Ainda de acordo com Delmanto, baseado nos lucros da Vale registrados em 2018, o pagamento da indenização de R$ 10 milhões para cada um dos mais de 270 mortos e desaparecidos no rompimento representaria cerca de 10% desse lucro. No entanto, segundo ele, o que vem sendo praticado atualmente pela Justiça brasileira são indenizações de cerca de R$ 1 milhão, que reduz a 1% o impacto nos dividendos da empresa. "Se a vale distribui lucros de primeiro mundo e para o primeiro mundo, por que ter indenizações de 3º mundo?", questionou.
Memoriais
Na ação judicial, os advogados das famílias Taliberti e Damian ainda requerem outras duas ações da Vale. A primeira é instalação de um memorial com uma foto de Camila, Luiz e Fernanda em todas as sedes e filiais da Vale e subsidiárias no mundo, acompanhada do texto "A vida vale mais do que o lucro. Camila, Fernanda, Lorenzo e Luiz desculpe-nos por tirar-lhes as suas vidas".
A segunda é a prática de uma homenagem às vítimas no início de todas as assembleias de acionistas convocadas pela empresa, nas quais o presidente da Vale seria obrigado a ler o mesmo texto constante nos memoriais acompanhado de um convite: "Peço um minuto de silêncio em respeito aos mortos de Brumadinho, convidando todos a ficarem em pé". De acordo com Delmanto, este pedido é uma resposta à postura adotada pelo então presidente da Vale, Fabio Schvartsman durante uma audiência ocorrida no Congresso Nacional no dia 14 de fevereiro, a qual o defensor classificou como "ofensiva, lamentável e de desdém". "Enquanto todos se levantaram durante o minuto de silêncio em homenagem às vítimas do rompimento, somente o presidente permaneceu sentado. Qualquer pessoa que tenha o mínimo de senso de empatia percebe o absurdo dessa atitude, imagine então a dor da família? É preciso que haja uma reparação moral", justificou.
Com a ação, o advogado espera que outros familiares de vítimas também procurem seus direitos junto à Justiça e oferece o texto da ação para todos que quiserem usá-lo como inspiração para ações próprias. "Qualquer familiar das vítimas de Brumadinho que quiser entrar com os mesmos pedidos, quero que fique à vontade para usar nosso texto, se inspirar na nossa ação e buscar a justiça pelo crime. É importante que todos saibam dos seus direitos e que não aceitem acordos injustos, lembrando que sempre é possível recorrer à Justiça Gratuita e ao pagamento posterior dos honorários do advogado, caso a vítima tenha menos condições", orientou.
Outro lado
Em nota, a Vale informou que não foi intimada ou citada para os termos desta ação. "No dia 8 de abril, a Vale e a Defensoria Pública do Estado de Minas Gerais assinaram Termo de Compromisso por meio do qual as pessoas atingidas pelo rompimento da Barragem de Brumadinho podem optar por acordos individuais ou por grupo familiar, para buscar indenização por danos materiais e morais", afirma a empresa.
Ainda segundo a mineradora, buscando agilizar as soluções para as questões emergenciais, a "Vale fechou, também, acordo preliminar que permite a antecipação dos pagamentos de indenizações emergenciais para todas as pessoas que residiam em Brumadinho ou que moravam até 1 quilômetro da calha do Rio Paraopeba desde Brumadinho até a cidade de Pompéu, na usina de Retiro Baixo, no dia do rompimento da barragem".
Até o momento, de acordo com a nota, 12.400 moradores já receberam as indenizações nos municípios de Brumadinho, Mário Campos e São Joaquim de Bicas. "Além disso, até 12 de abril, 272 famílias de vítimas em Brumadinho haviam recebido como doação, o valor de R$ 100 mil. A Vale ofereceu também atendimento médico em 10 hospitais particulares e unidades de saúde de Belo Horizonte mobilizados para atender aos atingidos", completa a empresa.
Tragédia
O rompimento da barragem da mina de Córrego do Feijão assolou uma extensa área em Brumadinho, na Região Metropolitana de Belo Horizonte, no dia 25 de janeiro deste ano. A tragédia deixou, até o último balanço da Defesa Civil de Minas Gerais, 231 mortos e outras 41 pessoas desaparecidas.
Camila e Luiz Taliberti eram irmãos e estavam, junto da companheira em união estável de Luiz, Fernanda Damian, hospedados na pousada Nova Estância, que foi engolida pelos rejeitos. O casal morava na Austrália e estava no Brasil para anunciar a gravidez de Fernanda, que esperava Lorenzo há cinco meses.
Segundo o advogado Roberto Delmanto Júnior, o laudo do Instituto Médico Legal (IML) apontou que Fernanda sofreu o aborto de Lorenzo no momento em que foi soterrada. "Eles morreram enterrados vivos, respirando terra, que é uma das piores mortes imagináveis, é preciso que haja uma reparação às vítimas deste crime", afirmou o advogado, que ainda declarou que a ação foi, sem dúvidas, a mais sofrida de sua carreira.