(Hoje em Dia)
Minas lidera o ranking nacional de novos registros de armas de fogo por pessoas físicas. Dados da Polícia Federal (PF) apontam que, no primeiro trimestre, 1.301 documentos foram emitidos pela corporação para o Estado, uma média de 14 por dia. Em segundo lugar aparece São Paulo, com 1.157, e, em terceiro, o Rio Grande do Sul, com 1.040 licenças.
Para especialistas em segurança pública, o número está diretamente ligado ao decreto publicado em janeiro, pelo governo federal, flexibilizando a posse de revólveres, pistolas e afins no país. Com a medida, cidadãos com mais de 25 anos foram autorizados a comprar até quatro armas de fogo para guardar em casa.
Apesar das exigências para que o solicitante passe por avaliação psicológica prévia e não tenha antecedentes criminais, pesquisadores do tema veem o cenário com preocupação.
Para Luiz Flávio Sapori, coordenador do Grupo de Estudos sobre Segurança Pública da PUC Minas, o acréscimo do número de armas ao alcance dos cidadãos, mesmo dentro das residências, pode aumentar a ocorrência de diversos crimes. “Quanto maior a disponibilidade, maior a possibilidade de homicídios, sobretudo feminicídios”, alerta Sapori.
Dados do Sistema de Informações sobre Mortalidade (SIM) do Ministério da Saúde revelam que o índice de mulheres mortas a tiros dentro de casa é quase o triplo dos registros referentes ao sexo masculino.
Dos 46 mil homens assassinados com o uso de armas de fogo em 2017 , dado mais recente do sistema, 10,6% perderam a vida dentro da residência. No caso das 2.796 mulheres que vieram a óbito da mesma forma, 25% foram em domicílio e, na maioria dos casos, foram vítimas do próprio companheiro.
Fetiche
Para o advogado especialista em direito penal Eduardo Milhomens, a procura por armas em Minas tem ligação com o fetiche de muitas pessoas em possuir um artefato que era altamente restrito e, após o decreto presidencial, se tornou muito mais acessível.
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Ele pondera, no entanto, que a ideia de que a posse de armas garante mais proteção aos cidadãos é “uma falácia”. “Muito pelo contrário. O que as pesquisas apontam é que pessoas armadas estão mais sujeitas à violência”, adverte.
Para Milhomens, é possível que uma sociedade mais armada conviva com mais crimes. “Já verificamos uma elevação dos casos de suicídio e feminicídio. É preciso investigar, mas pode ser que isso já seja um reflexo da flexibilização da posse”.
Policiamento
Porta-voz da Polícia Militar, major Flávio Santiago afirma que a liderança de Minas no ranking nacional de autorizações para posse de armas pode estar ligada ao tamanho do Estado. “Temos as dimensões territoriais da França”, compara.
No entanto, ele garante que é cedo para avaliar se o número pode impactar de alguma forma a segurança pública por aqui. “O armamento pode ser um grande aliado para uma família que corre riscos, mas essa decisão precisa ser alvo de muita reflexão”, afirma.
Poucos dias
O empresário Washington Tadeu, de 36 anos, foi um dos 1.301 mineiros que obteve a posse em 2019. Ele deu entrada no processo há menos de dois meses e cerca de uma semana depois já estava com o exame psicológico, a prova teórica e o teste de tiro, que são as medidas exigidas pela PF, marcados.
“Nem esperava que fosse tão rápido assim. Acredito que o procedimento é mais que suficiente para permitir a posse, mas fiz o curso também, que é opcional. Nele você aprende a manusear a arma de forma correta”.
Washington, que trabalha na casa onde vive com os pais, já adquiriu uma pistola calibre .380, que só pode ficar na residência. O empresário conta que sempre teve vontade de ter uma arma, mas que só com a nova lei foi possível concretizar o desejo.
"Agora estou associado a um clube de tiro e iniciando o processo para ser atirador esportivo, com o Exército. Aí terei autorização para adquirir armas para tiro desportivo, que poderei levar comigo quando for treinar”, diz.
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