(Lucas Prates)
A cada minuto, oito mulheres são vítimas de agressão no país, segundo dados do Fórum Brasileiro de Segurança Pública. O isolamento social imposto pela pandemia da Covid-19 agravou essa situação. Em Minas, a violência doméstica preocupa. As medidas protetivas cresceram no Estado, conforme a delegada Isabella Franca Oliveira, chefe da Divisão Especializada em Atendimento à Mulher, ao Idoso e à Pessoa com Deficiência e Vítimas de Intolerância. Nessa entrevista, ela fala sobre os mecanismos virtuais criados para atender as ocorrências e importância de denunciar os agressores.
Qual é o número de casos de violência contra à mulher em Minas? Aumentou na pandemia?
No início da pandemia, entre março e abril de 2020, foi percebida uma queda, com cerca de 2 mil registros a menos do que no mesmo período de 2019. Isso trouxe uma grande preocupação, porque era o início do isolamento social, com as pessoas reclusas em casa, com alguns fatores que podem intensificar a violência contra a mulher, como um controle mais excessivo desse agressor, o uso excessivo de álcool e drogas e, em alguns casos, as dificuldades financeiras. A partir de maio, começamos a observar um acréscimo. Houve um aumento significativo de medidas protetivas de urgência. Foram quase 10 mil a mais. E é sempre uma preocupação porque os registros não conseguem refletir a realidade da violência contra a mulher em razão da grande subnotificação. Com isso, houve implemen-tação de algumas políticas públicas.
Quais foram essas ações?
Agora existe a possibilidade do registro da ocorrência policial e a solicitação das medidas protetivas por meio da delegacia virtual. Tudo é feito pelo site da delegacia (clique aqui). A ocorrência também pode ser feita pelo aplicativo APP Cidadão, com download gratuito. Todo procedimento é feito de forma remota. No caso da mulher que já tem uma medida protetiva, ela pode registrar também o descumprimento.
Voltando aos números citados, eles são um reflexo do isolamento social?
Acredito que sim. Como a maioria das mulheres não saia para trabalhar, levar os filhos para a escola e passou a ficar mais tempo em casa com o agressor, houve uma dificuldade inicial em denunciar. Uma outra ação é que, durante a pandemia, existe uma legislação estadual que determina que os síndicos e administradores de condomínios residenciais, ao tomarem conhecimento da prática da violência doméstica ou se houver uma suspeita, têm obrigação de denunciar.
E os números em 2021?
Estamos com um equilíbrio em relação ao número de registros. Existe uma oscilação que é normal ao longo dos meses, mas não é tão significativa quanto no início da pandemia. Hoje, o número é um pouco menor do que nos mesmos períodos de 2020 e 2019.
O Fórum de Segurança Pública divulgou, agora em junho, que a cada minuto, oito mulheres sofrem violência aqui no Brasil. Em 2007, eram 4 mulheres agredidas a cada minuto. O índice que só cresce...
A violência doméstica e contra a mulher sempre existiu. Nos últimos anos, com maior confiança nos órgãos de segurança pública, no sistema de Justiça, com a legislação de proteção à mulher, como a Lei Maria da Penha, que é um marco no enfrentamento à violência, essas agressões passaram a ser mais notificadas. Observamos, com muita frequência na delegacia, mulheres que têm vários anos que vivem em um relacionamento abusivo, mas que ela demora a conseguir quebrar aquele ciclo e pedir ajuda. O ideal seria que não tivéssemos qualquer notificação de violência, mas é uma triste realidade e as notificações são importantes e mostram que as mulheres estão tendo consciência dos seus direitos, entendendo que não é possível aceitar qualquer tipo de violência.
“Nos últimos anos, a gente percebe uma preocupação cada vez maior com legislações de proteção à mulher e órgãos especializados, sempre pensando no acolhimento”, expica a policial.
Essa mesma pesquisa revela que 68% das mulheres, apesar de conhecerem a Lei Maria da Penha, não sabem quais são seus direitos. Como divulgar e orientar?
A divulgação é muito importante. O papel da imprensa é fundamental porque tem grande repercussão. Em março foi lançado pela Polícia Civil o “Manual de Enfrentamento da Violência Doméstica e Familiar Contra a Mulher”, que traz informações relevantes. O manual não só orienta as mulheres, como também as pessoas que testemunham um ato de violência. Todo cidadão tem o dever de denunciar para que as autoridades possam tomar as providências cabíveis e que essa mulher seja acolhida. Toda mulher que procura uma unidade policial tem que ser acolhida e não ser culpabilizada pelo fato. Toda essa conscientização das mulheres e da sociedade como um todo é muito importante.<EM>
Como está a rede de apoio à mulher aqui no Estado?
Cada município tem a sua. Aqui em Belo Horizonte existe o Centro de Referência Especializado no Atendimento à Mulher (Benvinda), que faz oi acompanhamento psicossocial com encontros para fortalecer essa mulher vítima de violência. Esse acompanhamento pode ser tanto antes de ser registrada uma ocorrência policial quanto depois. Existem núcleos da Defensoria Pública especializados. Existem, em vários municípios do Estado, as patrulhas de prevenção da Polícia Militar, que fazem visitas. Em Belo Horizonte tem uma promotoria especializada e as varas criminais também especializadas nesse atendimento. São vários órgãos que fazem esse acompanhamento multidisciplinar, que é muito importante. A partir do momento que a mulher vai a uma delegacia e faz o registro de uma ocorrência policial, ela não pode ir para casa só com aquele registro, ela precisa ser encaminhada para outros serviços.
Mas não tem delegacia especializada no atendimento à mulher em todos os municípios de Minas.
Não, hoje, com Belo Horizonte, são 71 delegacias especializadas. Essas delegacias ficam em cidades maiores e com maiores índices de violência contra à mulher. Mas, onde não existe uma delegacia especializada, todas as delegacias no Estado estão aptas a atender essa mulher e fazer todos os procedimentos que a Lei Maria da Penha prevê.
Quais são os outros canais para denunciar uma violência contra à mulher?
É possível fazer as denúncias pelo Disque 180, Disque Direitos Humanos, o Disque 100 e pelo Disque 181, onde qualquer pessoa pode denunciar um crime de forma anônima ou chamar a Polícia Militar.